voltar ao menu de textos
A Estética Visual da Cultura Popular Brasileira na Escola Pública
(A Pesquisa da Cultura Popular como Elemento de Formação do Aluno do Curso Normal)

Autores: Rose Mary Aguiar Borges[1] - roseborges28@uol.com.br e João Henrique Verly Serrão[2] - joaohenriquerj@hotmail.com.br


Resumo

Richter (1988) afirma que um dos principais objetivos de desenvolver o pensamento visual é de desenvolver a capacidade de pensamento interior. Se considerarmos que o primeiro contato consciente que temos ao contextualizar a realidade é o olhar, temos estabelecido que esse é um dos filtros mais importantes da nossa percepção. Portanto, quando trabalhamos a estética-visual nas artes, os alunos têm a possibilidade da (de)codificação dos objetos de seu mundo real, e de seu (re)conhecimento, capacitando-se criticamente para a compreensão dos fenômenos que conformam a sua realidade. (Justificativa) Acreditamos que trabalhar a cultura popular na escola, através da imagem, é proporcionar ao aluno o resgate de suas próprias raízes, a contextualização de seu mundo imediato, e a preparação para o entendimento multicultural. (Objetivo) Este Trabalho de Pesquisa tem por objetivo apresentar e discutir as diversas linguagens - visuais, musicais, simbólicas, teatrais - no processo de resgate das tradições populares brasileiras (folclore), através de sua leitura, aplicação no cotidiano escolar, de modo a centralizar nas atividades práticas, vivenciadas pelos alunos (nosso foco de atenção), uma vez que deslocamos o fazer artístico – muitas vezes meramente informativo – buscando uma aproximação com a realidade escolar e comunitária. (Metodologia) Para realização desta pesquisa utilizou-se o método Indutivo de Abordagem, empregando-se os métodos estatístico-descritivo e comparativo de procedimento, através da Observação Direta Extensiva e Intensiva - considerando como técnica a observação participante. Esta metodologia refere-se àquela aplicada na elaboração deste Trabalho e não àquela utilizada em sala de aula. (Benefícios) Desta forma, o foco de atenção descentraliza do professor (cujo conhecimento é repassado segundo a sua própria leitura de mundo) para o aluno, que através da pesquisa, apresenta a sua própria busca, criação, recriação, produção. O binômio ensino/pesquisa, nesta acepção, passa a ser indissociável na formação do estudante-cidadão.

Abstract

Richter (1988) states that one of the main objectives of developing the visual way of thinking is to develop the ability of the inner way of thinking. If we consider that the first conscious contact we have when regarding reality into a context is the look, we can establish that this is one of the most important filters in our perception. Therefore, when we work visual aesthetics in the arts, students have the possibility to (de)code the objects of their real world and get to recognize/know them, developing a critical ability to understand the phenomena of their reality. (Justification) We believe that working popular culture at school, through image, is to provide students with a possibility of rescuing their own roots, placing into context their immediate world, and preparing themselves to multicultural understanding. (Objective) This research, has the purpose of presenting and discussing the several kinds of languages - visual, musical, symbolic, dramatic - while rescuing Brazilian popular traditions (folklore), by reading, applying and adjusting into school routine, in order to centralize in practice activities, experienced by the students, our focus, once we have displaced the artistic making - many times merely informative - trying to find an approach with community and school reality. (Methodology) To carry out the present research, we have used the Inductive Approach method, and the comparative and statistical-descriptive method of procedure, by means of Intensive and Extensive Direct Observation - considering as technique the participant observation. Such methodology refers to the one applied in developing the Research and not necessarily the one used in class. (Benefits) Thus, the focus moves the attention from the teacher (whose knowledge is passed in accordance with his/her own world reading) to the students, who, by means of research, present their own search, creation, recreation, and production. The binomial teaching/research, under this point of view, becomes fundamental in the development of the student-citizen.

REVISTA DE LITERATURA
A Estética-Visual e a Cultura Popular no Ensino Formal

A Estética

A estética, etimologicamente, representa alguma coisa possível de ser percebida através dos sentidos humanos. Kant, com base nesse significado, definiu a estética como a “ciência que tratava das condições de percepção pelos sentidos”.

Entretanto, foi o alemão Alexander Baumgarten (1714-1762) que conferiu um novo significado à palavra estética, que passou a representar a ciência do belo, cujo objetivo era alcançar a “perfeição do conhecimento captado pelos sentidos”. (Cotrim, 1987, p. 100).

Mas a estética também pode ser entendida como a parte da filosofia que procura investigar a criação artística. Neste sentido, alguns dos problemas filosóficos tratados pela Estética referem-se aos fundamentos da arte e do belo, aos diferentes tipos de obras de arte, às relações da arte, da cultura, com a sociedade.

Contudo, não é fácil explicar, exatamente, o que nos encanta numa obra de arte bem como o seu próprio significado. Dentre suas inúmeras definições, Susanne Langer, pensadora americana, apresenta-nos uma definição bastante abrangente definindo a arte como “a prática de criar formas perceptíveis expressivas do sentimento humano.” Portanto, quando falamos da prática da criação, temos estabelecido que a arte é produto do fazer humano, desenvolve a prática do fazer, com a imaginação do homem, ato criativo. A arte também se concretiza em formas que são perceptíveis, percebidas por nossa mente, podendo ser essas formas estáticas (uma obra arquitetônica ou uma escultura) ou formas dinâmicas (uma música, a dança). E ainda as formas expressivas, onde a arte é sempre a manifestação (expressiva) do sentimento humano, incluindo-se nesse campo tudo aquilo que possa ser sentido. (Cotrim, 1987, p. 101).

Há uma distinção entre a educação estética e a educação artística, que, segundo Almeida (1980, p. 19), diferem uma da outra porque a primeira é uma educação da consciência em função da Beleza, educação que influi, como catalisador, na vida intelectual. A Segunda é uma educação também em função da Beleza, mas processa-se através da capacidade de se dominar a matéria.

De maneira esquemática, o sentido do trabalho artístico, então, seria tornar objetivas (no sentido de concretas) as manifestações subjetivas dos seres humanos, numa dada época e cultura.

Numa outra perspectiva, se considerarmos a experiência estética, que pode ser definida como a experiência da beleza, poderemos entrar num outro campo de discussão sobre o seu significado (Duarte Jr. 1986, p. 56). O autor atenta para o significado por de trás dos termos beleza e belo que cotidianamente utilizamos. Afirma que somos tentados a crer que o belo se encontre nos objetos mesmo, ou seja, que a beleza é uma qualidade que eles possuem (ou não), o que não é verídico, pois se assim o fosse, um cientista que estudasse ‘objetivamente’ uma obra de arte, seria capaz de isolar, quantificar (medir) tal qualidade, o que não é possível, uma vez que a beleza como propriedade física não será encontrada.

Nesta mesma perspectiva, atenta o autor que uma vez que não encontramos a beleza nos objetos, podemos pensar que ela reside, então, em nossa mente, gerada por nossa consciência, o que seria incidir num novo erro. Exemplifica que se tal afirmação fosse verdadeira, um amante de música, por exemplo, não mais precisaria ir a concertos de músicas, nem ouvir discos, uma vez que para experenciar a beleza bastaria relembrar as experiências estéticas passadas, para “produzir” novamente a beleza em sua consciência.

Em contraposição a estas idéias, Duarte Jr. (1986, ibid), afirma que o belo não reside nem nos objetos nem na consciência dos sujeitos, mas do encontro dos dois. A beleza se coloca entre o homem e o mundo, entre a consciência e o objeto. A beleza habita, pois, na relação que estabelecem um com o outro.

Por este motivo, Umberto Eco, filósofo italiano, (citado por Duarte Jr, 1986, p. 61), chama a obra de arte como “aberta”. É aberta para que o espectador complete o seu sentido, para que ele a vivencie segundo sua própria condição existencial, conferindo uma determinada direção aos sentidos do espectador, segundo sua própria situação, suas próprias experiências, de acordo com os meandros dos sentimentos que lhes são próprios. A maneira como o tema da obra de arte é expresso, a forma como é percebido, sentido pelo espectador, é que constitui o campo de sentidos da arte. Aqui adentramos também o campo do imaginário, das emoções que permeiam a obra de arte. A relação que se constrói entre o sujeito – consciência – e o mundo – objeto.

A Imaginação, neste sentido, seria o poder em evocar ou produzir imagens, muitas vezes independentemente da presença dos objetos aos quais estas imagens se referem. A origem do imaginário está, por exemplo, nos sonhos, onde vivemos as mais diversas situações, impossíveis e extraordinárias, tanto quanto nos desejos, onde a imaginação nos traz à mente, com insistência, o objeto desejado; e ainda nos estados de consciência alterados por produtos alucinógenos.

O ato criativo encontra no campo imaginário sua fonte de inspiração. Não podemos negar que tanto maior a capacidade de detectar o mundo a sua volta, de estabelecer uma relação deste com o sujeito que o percebe, tanto maior a capacidade de (re) criar sobre tais investigações perceptivas.

Edgar (citado por Richter, 1988, p. 102), justifica a sugestão de que a unidade entre o pensamento visual, ensino visual e comunicação visual seja estabelecida nas escolas de modo que através do estudo da comunicação visual, os estudantes desde a mais tenra idade, possam aprender a pensar e a expressar-se visualmente. Portanto, afirma o autor, que uma obra de arte completa é tanto uma expressão intelectual quanto emocional de uma atitude de experiências apresentada de uma maneira pessoal. Continua o autor discorrendo sobre a importância de outro requisito no programa de arte, isto é, apreciação de arte através da história da arte, uma vez que é através desta apreciação que as crianças se tornam conscientes de sua cultura e desenvolvem o julgamento crítico, particularmente com respeito à comunicação de massa.

De acordo com Martine (1996, p. 47), a análise da imagem, inclusive da imagem artística, pode desempenhar funções diferentes quanto dar prazer ao analista, aumentar seus conhecimentos, julgar criticamente, lendo ou percebendo com maior eficácia as mensagens visuais.

Macfee, arte-educadora, (apud Richter, 1988, p.103), enfatiza a relação entre a arte e a vida. Ela sente que as diretrizes para o desenvolvimento de um programa de artes deveriam estar baseadas na relação entre sociedade, arte e educação. Nesta mesma perspectiva, Demo (1997, p. 95) afirma que a influência da escola sobre a criança é cada vez mais “formal” e, neste sentido, vazia, pela artificialidade da sua organização distanciada da sociedade diária ou ainda pela concorrência avassaladora com os meios de comunicação. Assim, o que o professor faz na escola pode ser irrelevante ou inócuo.  De acordo com Macfee (1988, ibid), uma função importante do arte-educador é analisar manifestações da cultura popular de maneira que os alunos possam preservar sua continuidade cultural aprendendo a respeitar os símbolos de sua própria cultura, e ao mesmo tempo tendo a oportunidade de aceitar a apreciar todas as formas das artes visuais.

A Cultura Popular

Nas sociedades tecnológicas, podemos identificar três aspectos básicos da cultura, considerando as diferenças no tocante à forma como é produzida e utilizada por essa mesma sociedade. Embora as discussões atuais sejam muito mais amplas e profundas do que a preocupação com a classificação e a nomenclatura deste ou daquele termo e considerando igualmente que a conceituação seja mais complexa e esteja associada a pontos de vista distintos, estaremos, didaticamente, apresentando algumas possíveis definições sobre a cultura erudita, a cultura de massa e a cultura popular. Mais adiante, discutiremos alguns de seus aspectos, considerando a opinião de diversos autores e estudiosos.

A Cultura Erudita poderia ser entendida como aquela produzida no seio das instituições acadêmicas. As universidades, centros de pesquisa, conservatórios de músicas, as academias de letras, seriam centros de referências por excelência, no interior dos quais, por consenso entre os seus pares, estariam definidos os padrões, regras e normas que oficializariam a cultura erudita. Portanto, tem um caráter oficial na sociedade, uma vez que é nos seus achados que são embasadas as políticas de Estado (educação, saúde, desenvolvimento, etc.). Sua principal forma de transmissão se dá pela escrita, o que garante sua fidedignidade através dos anos. Identifica-se como a cultura das classes dominantes da sociedade, com a produção dos homens cultos. Seu universo abrange todo o saber produzido institucionalmente ou referendado pelas instituições e referenciados pela Ciência e pela Filosofia.

A Cultura de Massa caracterizara-se basicamente por ser veiculada pelos meios de comunicação de massa, os chamados ‘mass media’ – rádios, jornais, televisão, internet – Fruto do desenvolvimento industrial e tecnológico, que ampliou o alcance dos meios de comunicação. Consiste na produção em larga escala de artigos de moda, lazer, música, cinema, imprensa, TV, eventos e produtos diversos, bem como sobre a influência que exerce sobre a população no consumo destes bens. Pretende alcançar um grande número de pessoas, determinando tendências, com objetivo principal do consumo ampliado e lucro fácil.

A Cultura Popular, ao contrário das outra duas, é aquela que não é produzida no interior das instituições ou centros acadêmicos, e nem pelos meios de comunicação de massa. Surge espontaneamente no seio do povo como manifestação coletiva, não se submetendo às avaliações dos centros formadores, ficando à margem das instâncias formais das academias. Sua transmissão se oralmente, pela fala ou pela imitação, mediada pelas relações familiares, de vizinhança, de amizade, de geração a geração, com manutenção de usos e costumes próprios peculiares àquela comunidade. Esta cultura permeia toda a sociedade, prescindindo de um espaço próprio para se manifestar: pode acontecer na casa, na rua, na feira, na barbearia, na praça, entre outros espaços orgânicos sociais. Ela não consagra autores, é anônima, de criação coletiva.

Entretanto, a cultura popular, segundo Arantes (1981, p.7), ainda não é um conceito bem definido pelas ciências humanas e especialmente pela Antropologia Social, disciplina que tem dedicado particular atenção ao estudo da “cultura”. São muitos os seus significados e concepções, orientando fatos bastante diversos a serem observados pelo pesquisador. Como dois pontos de vistas extremos e clássicos, podemos identificar o primeiro ponto como referência a aspectos da tecnologia (técnicas de trabalho, procedimentos de cura, etc.), e de “conhecimento” do universo, enquanto o segundo enfatizaria as formas artísticas de expressão (literatura oral, música, teatro, etc.). Enquanto um tende a pensar no passado, como algo que foi ou logo será superado, outro os pensa no futuro, vislumbrando neles elementos de uma nova ordem social. Neste mesmo espectro, vemos, portanto: de um lado, a “cultura popular” concebida por contraste ao termo genérico “cultura” em seu uso corrente e, por outro lado, como suporte de uma idealização romântica da tradição, que é uma perspectiva freqüentemente encontrada nas teorias de muitos folcloristas, além de amplamente difundida entre diversos setores da sociedade.

O Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, de Aurélio Buarque de Hollanda, registra que a palavra ‘cultura’, em seu uso corrente, significa “saber, estudo, elegância, esmero”. Desta forma, tal vocábulo evoca os domínios da filosofia, das belas-artes e das ciências. Temos que nas sociedades estratificadas em classes, essas esferas da “cultura” são, na verdade, atividades especializadas que têm como objetivo a produção de um conhecimento e de um gosto que, partindo das universidades e das academias, são difundidos entre as diversas camadas sociais como os mais belos, corretos, adequados, regras e normas a serem seguidas. Neste sentido, ser ‘culto’ é uma condição que engloba vários atributos, como ter razão, bom gosto, possuir conhecimento, saber, estar informado. Entretanto, acoplados a esses valores, muitas outras concepções e variáveis estarão presentes, uma vez que outros valores serão implementados socialmente, através de complexos mecanismos de produção e divulgação de idéias, como se fossem ou devessem ser tomados como o modo de agir e de pensar de todos naquela sociedade. (Arantes, 1981, p.9-10).A expressão “cultura popular” tem sua relação, no passado, com a separação de classes, seus modos de pensar e de agir. Entre grupos dominantes (elites) e dominados (subalternos), expressando as diferentes concepções, os modos de vida de cada classe. (Beisiegel, 1985, p.41).

Sob os efeitos da generalização dos direitos da cidadania, da extensão de um mínimo de bens e serviços a setores cada vez mais amplos da coletividade, da crescente complexidade do mercado de trabalho e da estratificação social, e mais ainda, da expansão dos meios de comunicação de massa, da “democratização” das informações e do desenvolvimento de uma indústria da cultura, os limites entre o que é e o que não é “popular”, a natureza daquelas diferenças e os processos de interação de uma “cultura dominante” com uma “cultura do povo” seriam, agora, bem mais complexos e estariam adquirindo novas características”.

Nesta mesma perspectiva, o que se observa hoje, segundo os folcloristas e os filósofos críticos é que há uma fragmentação da cultura popular, tanto quanto da cultura considerada supostamente ‘superior’, a cultura de elite. Há, segundo os estudiosos, uma crise das culturas autênticas (a clássica e a folclórica), de onde se tem que hoje é a cultura popular urbana e a cultura de massa, intermediárias, que estão mais vivas.

Umberto Eco (apud Carvalho, 1992, p.31), também sugere que já não há mais diferentes tipos de cultura, uma vez que, para sermos realistas, tudo hoje vem a ser cultura de massa: do folclore, passando pela cultura popular, à cultura erudita. Isso, segundo Eco, parece certo, mas só num planos muito geral e superficial. No fundo, enormes diferenças continuam existentes.

Contudo, embora não se encontre com facilidade esta autenticidade perdida, e quase não há essas relações em estado puro, ainda existem como idéias. “Há uma mentalidade bem definida que se expressa em determinados objetos ou formas estéticas objetificadas – uma quadra em verso, uma vestimenta, um ritmo de tambor, [...] são signos diacríticos de uma experiência social muito particular.” (Carvalho, 1992, p. 32).

O Folclore é a ciência considerada indispensável para o conhecimento social e psicológico de um povo. Segundo o sociólogo André Veragnec (apud Megale, 2000, p.12), “é a civilização tradicional reunindo tudo o que o homem de qualquer nível cultural aprendeu fora dos livros, da escola ou de qualquer meio de difusão cultural.” Embora não percebamos, o folclore tem grande influência em nossa maneira de pensar, agir e sentir. Reflete-se nas lendas, nas estórias contadas – literatura oral – de geração a geração, nas cantigas de roda, nos versos recitados ou nas canções de nossa terra, impregnadas da tristeza, por vezes mistérios de nossos antepassados. Também está presente nos utensílios domésticos, festas jogos, músicas, que acompanham nossas horas de lazer, assim como nos objetos ornamentais, e nos instrumentos da pesca e da caça. Pode ser considerado como “a história não escrita de um povo”, resumindo as tradições e as esperanças das coletividades. Não é estático, mas essencialmente dinâmico, pois embora se baseie no passado, acompanha e se acomoda às reivindicações presentes.

Os historiadores vêem no folclore um capítulo particular da história, pois ele explica vários fatos não registrados, servindo para a apuração do grau de adiantamento dos povos primitivos. “Aprofundando as investigações, notou-se que o saber tradicional do povo não se refletia apenas na parte espiritual, mas também na material, como as artes e técnicas populares, inegavelmente associadas a um sem-número de manifestações de saber.” (Megale, 2000, p. 14).

O folclore, além dos benefícios culturais, ajuda-nos a compreender os problemas sociais brasileiros, pois reflete os conhecimentos aceitos por nossos antepassados e transmitidos às gerações modernas. Preserva e sedimenta os principais distintivos de cada povo.

Talvez o maior interesse em se trabalhar o folclore na tarefa educativa, seja não tão somente os aspectos culturais relevantes de penetração no campo do ensino, mas fundamentalmente os sentimentos que suscita, o espírito de tradição e de continuidade de um povo, como, igualmente, a valorização do “seu aspecto de ciência, de estética e de comunidade evitando assim que seus padrões tradicionais sejam substituídos por modelos exóticos e alienígenas.” (ibid, p.132).

A respeito do folclore como elemento educacional, Carvalho Neto (1981, p.6-7) faz-nos uma distinção entre folclore informativo e folclore como elemento formador. No primeiro caso como ilustração ou fonte de dados, no segundo como fator conduzente à integração da personalidade.

“O folclore como informação tem por objetivo imediato a apresentação do fato pelo fato, como novidade, acervo de conhecimento [...] o objetivo imediato do folclore como formação não é a apresentação do fato pelo fato, mas sim alcançar finalidades éticas, estéticas, mnemônicas e outras. Como informação, o folclore é o fim; como formação é um meio.”

Desta forma, temos que o aproveitamento do folclore na escola de ensino fundamental é das mais válidas contribuições, pela sua intenção formativa e pelo seu caráter de nacionalidade que imprime. Já no ensino médio sua maior contribuição será no plano informativo.

“Numa prospecção profunda da cultura, que levará a conclusão consciente de que toda a cultura tem uma dignidade e um valor, que devem ser respeitados e protegidos em fecunda variedade, e em sua diversidade e pela influência recíproca que exercem uma sobre a outra. Todas as culturas fazem parte do patrimônio da humanidade.”
(Megale, 2000, p.133).

METODOLOGIA

Este trabalho constitui-se numa pesquisa aberta participante que teve por objetivo conhecer, ampliar e incentivar a aquisição de conhecimentos da estética visual da cultura popular, levando-se em consideração os conhecimentos preexistentes dos alunos – futuros professores – do Curso Normal do 1.º ano do Instituto de Educação de Nova Friburgo (IENF) no Rio de Janeiro. Para tanto, este trabalho foi dividido em duas etapas fundamentais, que serão apresentadas mais à frente (primeira e segunda etapas).

A metodologia deste trabalho baseou-se em Lakatos e Marconi (1992). Para a realização desta pesquisa, utilizou-se o método Indutivo de Abordagem, empregando-se os métodos estatístico-descritivo e comparativo de procedimento, através da Observação Direta Extensiva e Intensiva – considerando como técnica a observação participante. Esta metodologia refere-se àquela aplicada na elaboração deste Trabalho e não, necessariamente, àquela utilizada em sala de aula.

Primeira Etapa: Neste primeiro momento, tivemos o cuidado de trabalhar a informação trazida pelo aluno a respeito de estética, cultura popular, cultura erudita, folclore e suas manifestações (regionais e nacionais), e a importância de se trabalhar esses elementos na formação do aluno. Nosso objetivo, neste momento, é tomar conhecimento da realidade do aluno, no sentido de se saber quais são as suas limitações na busca dessas informações e/ou conhecimentos. Utilizou-se como método de abordagem o Indutivo, com procedimento descritivo. Para que pudéssemos alcançar este objetivo, nesta primeira etapa, empregamos a técnica de observação direta extensiva, utilizando-se um questionário com perguntas do tipo abertas  – nosso instrumento de coleta de dados, cujos resultados serão apresentados no próximo capítulo (resultados e discussão) – que foi destinado a 104 (cento e quatro) alunos do 1.º ano do Curso Normal, IENF, divididos em três turmas, (a que chamamos A,B e C) constituindo-se numa pesquisa do tipo ‘censitária’, se considerarmos que nosso universo de pesquisa abrangeu todos os alunos do 1.º ano do referido curso, durante o 1.º semestre do ano de 2002.  Posteriormente à coleta dos questionários, passou-se à análise dos resultados (entendidos aqui como as respostas conferidas pelos alunos), os quais procuramos quantificar, através da estatística descritiva. Estes resultados foram transformados em gráficos que têm a finalidade de permitir uma melhor visualização e distribuição destes dados. A partir da análise desses resultados, direcionou-se a segunda etapa deste trabalho.

Segunda Etapa: Este segundo momento é o desenvolvimento do trabalho propriamente dito, onde os alunos também incursionam pelo caminho da pesquisa. Aqui se desenvolve a pesquisa documental (bibliográfica) realizada pelos próprios alunos, a partir das perguntas do questionário, que se transformaram em temas de pesquisa bibliográfica. Também nesta etapa desenvolveram-se as atividades práticas relacionadas aos temas de pesquisa, propostas pelo professor e selecionadas pelos alunos.

A partir dos resultados encontrados com a coleta de dados do questionário citado na primeira etapa, propusemos aos alunos um trabalho de pesquisa de grupo, cujo objetivo era a investigação de manifestações da cultura popular local, regional (folclore) e nacional – partindo-se do micro para o macro – afim de que pudessem ampliar os seus conhecimentos sobre cultura popular. Como se tratavam de 5 (cinco) temas abordados, as três turmas foram subdivididas em três grupos, cada uma, (nove grupos ao todo). Alguns temas foram trabalhados por grupos das três turmas (escultura e literatura de cordel), outros temas foram distribuídos distintamente por turmas e por grupos.

Quadro: temas de pesquisa e atividades desenvolvidas, distribuídos por turma e por grupo.
 

Temas de Pesquisa / Atividades Práticas
Turma Envolvida /Grupos Envolvidos
Escultura (artes plásticas)Turma A – G.1Turma B – G.1 Turma C – G.1
Literatura de Cordel (xilogravuras, artes plásticas)Turma A – G.2Turma B – G.2 Turma C – G.2
Carnaval (festa popular, danças, canto, criação plástica)Turma A – G.3XX
Bumba-meu-boi (folguedo, dança, dramatização, criação plástica)XTurma B – G.3X
Rituais Indígenas (dança e indumentária – artes plásticas)XXTurma C – G.3

 

A essência do trabalho, nesta etapa, era buscar a abrangência do conhecimento estético visual da cultura popular regional ou nacional, representada pelas diferentes formas de manifestação folclórica ou arte popular do país. Buscamos o entendimento do Micro para o Macro, do específico para o geral. Nesta etapa, procurou-se dar ênfase às linguagens folclóricas que permeiam a nossa arte popular, assim como música, dança, vestimentas ou indumentária, criação plástica, literatura de cordel, folguedos, ritos, usos e costumes da cultura popular brasileira.

Este Trabalho teve duração de quatro meses, portanto, as atividades transcorreram durante o semestre letivo. A primeira etapa do trabalho, ou seja, o questionário inicial que responderam e que deu origem aos demais temas, envolveu a primeira quinzena do semestre. A segunda etapa do nosso trabalho teve duração de três meses e meio, sendo os três  meses inicias destinados à  pesquisa documental indireta (através de livros, artigos, videotecas, discos, fitas, revistas e jornais, etc.) sobre significado de estética, cultura popular, folclore e cultura erudita. Paralelamente a esta pesquisa, foram realizadas as atividades práticas que também demandaram uma pesquisa específica de cada tema abordado por cada grupo de cada turma. As últimas semanas do 4º mês foram destinadas à apresentação dos resultados, sob forma de uma culminância criativa, onde cada grupo apresentou o seu trabalho aos demais alunos da turma. Estes resultados serão mais bem comentados no próximo capítulo deste artigo, intitulado resultados e discussão.

A pesquisa escrita sobre os diferentes temas abordados (escultura, literatura de cordel, carnaval, bumba-meu-boi, rituais indígenas) foi entregue formalmente ao professor,  compondo-se de revisão literária e sendo constituída, igualmente, por recortes, gravuras, esquemas ou diagramas que procuravam ilustrar a evolução do tema pesquisado.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Neste capítulo propomo-nos a apresentar os resultados de nosso Trabalho de Pesquisa. Como este trabalho dividiu-se em duas etapas como já detalhado no capítulo anterior (metodologia), passamos a apresentar, aqui, os resultados obtidos na primeira etapa, ou seja, as respostas dos alunos ao questionário. Discutimos os aspectos mais relevantes, que caracterizam o entendimento daquele assunto abordado na questão. Procuramos selecionar aquelas cujas respostas mais nos interessavam, observando os objetivos gerais do nosso trabalho.

Num segundo momento, ainda dentro deste capítulo, passamos a discutir os resultados do trabalho de pesquisa realizados pelos próprios alunos e suas respectivas apresentações, de acordo com os temas por eles investigados.

Etapa 1 – Apresentação e Discussão dos Resultados do Questionário.

Corresponde à questão n.º1 do questionário, que procura averiguar o entendimento que os alunos têm a respeito de cultura popular. Compilamos as respostas das três turmas de 1º ano do Curso Normal, procurando categorizar as respostas mais comumente encontradas, durante a explicação do termo. Não estávamos preocupados com a questão conceitual formal, uma vez que são oriundos de diversos outros centros formadores de ensino e, portanto, partimos do princípio que, em primeiro lugar, têm (in)formações distintas e, segundo, muitas vezes não possuem nenhuma informação. Nosso objetivo era verificar qual o seu próprio entendimento de cultura popular, diante do questionamento, sem nos preocuparmos com o linguajar formal.

Ao analisarmos as respostas da questão 1, verificamos que o seu entendimento de cultura popular pairava, majoritariamente, sobre respostas que referenciavam os costumes e as tradições populares bem como as manifestações coletivas. Verifica-se no consolidado das três turmas A,B e C, que 78% dos alunos entendem que a cultura popular está associada a aspectos de natureza coletiva, encontrando nos costumes e tradições sua origem, não estando sob interferência das instituições ou academias. Apenas uma pequena parcela, 22%, em sentido contrário, fazem associação da cultura popular com cultura erudita e, mesmo assim, registram a cultura popular ao folclore ou não sabem responder.

A questão 8 procura verificar o que o aluno entende por cultura erudita. No consolidado das três turmas, observamos que 76% dos alunos do 1º ano do Curso Normal não têm entendimento sobre o que seja cultura erudita. Em algumas das respostas, alguns alunos fazem associação com música erudita, mas logo depois dizem ter apenas ouvido a menção, não sabendo definir o que entende pelo termo erudito e nem sabendo explicar sua oposição em relação à cultura popular. Interessante verificar que na turma B, talvez pela estranheza do próprio vocábulo, fazem associação com cultura indígena 19% dos alunos, mostrando o desconhecimento do que seja cultura erudita, enquanto que na turma C, 18% definem como sendo o que eles próprios denominam como “cultura dos antepassados” ou “cultura vivida pelos antigos”. Se na definição clássica considerarmos que o conceito de cultura erudita tem associação com o conhecimento produzido nos seios na instituições acadêmicas e referendadas por elas, temos que apenas uma parcela quase desprezível, de  11% , da turma B, aproxima-se no ‘conceito’ tal qual consideramos como definição clássica.

A questão 2 do questionário compila as respostas referentes à pergunta sobre estética, o entendimento do que seja estética. Este gráfico é um consolidado das repostas das três turmas, onde podemos observar que  51,9% dos alunos entendem estética relacionada aos cuidados corpóreos, ‘beleza’ estritamente relacionada ao corpo físico, estética facial, anatomia do corpo. Muito provavelmente isso se dê pelos apelos consumistas veiculados pelos meios de comunicação de massa, e ao novo sentido empregado ao estético que mais se relaciona à esteticista, àquela que é versada na beleza do corpo e não ao entendedor da obra de arte.  O sentido do ‘belo’ aqui, embora intuitivamente aproxime-se do certo, é restrito e  desconsiderado quando em associação com a estética da obra de arte, o que pode ser observado em outras questões abordadas pelo questionário.

Meio a outras definições, encontramos a aproximação com os valores, com a aparência das obras de arte para 12% dos alunos pesquisados, abordando a relação que mantemos com os objetos. Interessante é que 8% dos alunos observam a arte da dança, a contemplação e a estética do movimento, do comportamento do corpo em ação.

A questão n.º 5 do questionário foca o entendimento sobre folclore. Igualmente como nas questões anteriores, queríamos apenas conhecer a definição que foram construindo para si, a partir de sua própria ‘bagagem cultural’. É importante lembrar que, a partir destas emissões de opinião, conceitos formulados pelos alunos, acertada ou erradamente, passamos a direcionar todo o restante do trabalho. Assim, os temas das pesquisas e atividades práticas decorrentes, surgiram a partir do entendimento (ou do não) sobre estes termos ou conceitos.

Inicialmente nos chama a atenção que 60% dos alunos entendem que o folclore está intimamente associado à cultura popular ou à cultura inerente de cada povo. Dentre os alunos entrevistados, 36% citam manifestações folclóricas, embora não saibam se aproximar de uma formulação, de um conceito. Observamos que, embora oriundos de instituições distintas, com realidades distintas, o folclore nos parece um conteúdo amplamente trabalhado na formação daqueles alunos, e as respostas embora carecidas de uma melhor estruturação conceitual, eram sempre permeadas de ricas citações das diversas manifestações folclóricas, o que nos sugere a sua ampla penetração do campo do ensino, particularmente na formação daqueles alunos investigados, como já mencionado.

Etapa 2 – Apresentação dos Resultados da Pesquisa dos Alunos sobre os Temas Abordados da Cultura Popular Brasileira.

A partir de uma análise mais apurada do questionário – instrumento de investigação da primeira fase – propomo-nos a fazer uma pesquisa mais ampla sobre cultura popular, cultura erudita, estética e folclore. Esses temas de pesquisa propostos a partir do questionário que responderam, objetivavam uma busca desses ‘conhecimentos’ pelos próprios alunos, o que seria importante para uma segunda pesquisa, mais específica sobre a cultura local, regional e nacional. Neste segundo trabalho, os alunos, além da pesquisa documental, realizavam trabalhos práticos de acordo com os temas abordados.

Este trabalho de pesquisa foi realizado por todas as turmas do 1º ano do Curso Normal. Cada turma dividida em 3 (três) grupos, formados em média por 10 a 12 alunos, que se agruparam por afinidade ou por já terem estudado juntos anteriormente, em outras unidades escolares. Esta formação dos grupos deu-se espontaneamente sem intervenção do professor, que esteve presente durante todas as fases do trabalho, na função de um orientador participativo. A distribuição dos temas, por grupos e por turma, está explicitado no quadro sobre ‘temas de pesquisa e atividades desenvolvidas distribuídos por turma e por grupo’, no capítulo anterior, sobre a metodologia do trabalho de pesquisa.

Para que se definissem os temas a serem trabalhados sobre a estética visual da cultura popular local, com ênfase nas atividades culturais e folclóricas da cidade, algumas propostas foram discutidas com os alunos, que ao final, decidiram pela pesquisa da obra de um artista popular da cidade, de nome Geraldo Simplício – o “Nego” – (natural da região do Ceará, residindo há 20 anos na cidade). Este artista, muito renomado na cidade e mesmo fora dela, por seus trabalhos de escultura no barro encobertos de musgo – pareceu-lhes como uma verdadeira fonte de inspiração para uma releitura em argila da obra do artista, trabalho este executado na escola pelos alunos. Este tema de trabalho, tanto quanto as atividades práticas decorridas a partir desta pesquisa – documental e entrevista realizada junto ao artista de pseudônimo “Nego” – foram desenvolvidas por três grupos, um de cada turma, focando o trabalho daquele artista, inicialmente, e depois realizando as suas próprias esculturas em argila, numa espécie de (re)leitura do trabalho observado.

“Para mim, fazer uma escultura após ir ao ‘Jardim do Nego’ foi muito legal, até porque cada um desenvolveu em sua escultura uma criatividade que cada um escondia em si mesmo. Quem sabe um dia, um de nós também será uma artista como o ‘Nego’”
Lutiene S. Bittencourt – aluna turma B, 1º ano Curso Normal

“Na minha opinião esse trabalho com escultura foi muito educativo, pois nos permitiu a elevar a nossa criatividade e demonstrá-la através das esculturas.  Eu também gostei muito do trabalho do ‘Nego”, ele tem um talento incrível e suas esculturas são lindíssimas.”
Juliana Inácio da Silva – aluna turma B, 1º ano Curso Normal

Paralelamente, um outro grupo selecionou um tema de pesquisa (dentre os diversos sugeridos pelo orientador) que versasse sobre uma cultura popular ou folclore de uma região do país, que não fosse a cultura local. O segundo tema selecionado foi à literatura de cordel.*
(*) Poesia narrativa, popular e impressa.

Esta pesquisa – literatura de cordel – foi um trabalho interdisciplinar, envolvendo os professores de história (que desenvolveram o tema da literatura de cordel: ‘política’ e ‘futebol’); o de língua portuguesa (que desenvolveu o texto de cordel; tipo de narrativa utilizada; estilo) e nas artes, o professor / orientador da pesquisa,  que desenvolveu a parte plástica, através da xilogravura (ilustrando a capa dos livretos) dentro dos temas abordados. A apresentação foi feita pelos alunos no espaço físico na própria escola, como uma exposição dos livretos, dependurados num ‘cordel’, a exemplo de como é feito em sua região de origem, o Nordeste brasileiro.

"Pesquisar literatura de cordel foi um trabalho super interessante, pois abri o que é a literatura de cordel, como surgiu a história e vi também a história do cordel no Nordeste, aprendi também que a xilogravura é a arte de gravar em madeira tudo que acontece em nosso país de forma crítica e descontraída. Foi um trabalho difícil e complicado, mas apesar de tudo gostei muito de tê-lo feito”.
Dilcineia Poletti– aluna turma C, 1º  ano Curso Normal

A pesquisa de cultura popular de enfoque nacional proposta inicialmente para as três turmas foi o carnaval, como expressão de nossa maior festa popular. Entretanto, somente um grupo, da turma A, aceitou o tema. Demais grupos de outras turmas sugeriram a pesquisa de outras manifestações populares do país, tais como o bumba-meu-boi** (turma B) e os rituais indígenas (turma C), como representação da miscigenação de nossas raças, e de suas culturas.

A turma A, além da pesquisa documental através de livros, artigos de revista e jornais, periódicos, internet, convidou pessoas da comunidade (como o Sr. Ailton Pacheco – carnavalesco) ligadas a escolas de samba da cidade, para orientação de confecção de fantasias e adereços, para a montagem de um bloco carnavalesco. Esta pesquisa também contou com a visitação da quadra de uma grande escola de samba do município do Rio de Janeiro, a “Mangueira”, objetivando conhecer o funcionamento e estrutura de uma grande escola de samba que envolve toda uma comunidade num trabalho de  cultura popular, realizado durante os 365 dias do ano, em busca da perfeição do trabalho estético-visual, para sua apresentação numa grande culminância nacional: o Carnaval.

A turma B fez uma pesquisa sobre o bumba-meu-boi* – pesquisa documental e pesquisa direta – com criação plástica das máscaras utilizadas na festa do boi.

(*) uma das mais ricas manifestações do folclore brasileiro. É o folguedo de maior significação estética e social do Brasil e foi o primeiro a conquistar a simpatia dos indígenas durante a Catequese.

Foi realizada uma dramatização com a dança do boi (boi dançarino) em cima da história da Catarina (espécie de ópera popular entorno de um lenda, que tem variações de acordo com a região do Brasil onde é contada).

A turma C também fez uma pesquisa documental e uma entrevista com um indígena sobre os rituais indígenas, com o objetivo de conhecer e apreender os movimentos e significados da dança e dos rituais, para apresentação na escola. Para este trabalho de corpo, foi convidada uma professora de dança da comunidade, prof.ª Berta, que , gentilmente, fez a orientação artística da dança, da indumentária e dos instrumentos de percussão. O resultado foi a apresentação de um ‘ritual indígena’ aos demais alunos.

CONCLUSÃO

Quando se fala de conclusão de um trabalho de pesquisa, há de se rever quais foram os objetivos expressos no início deste trabalho, e se esses objetivos foram atingidos de forma parcial, total ou se não foram atingidos. Quando propusemos este trabalho, tínhamos em mente a ampliação de conhecimentos dos alunos sobre a estética visual da cultura popular (local, regional e nacional), buscando através das linguagens artísticas os seus significados, origens e importância na constituição do homem enquanto ser social.

Poderíamos ter optado pela “transmissão dessas informações” através de aulas expositivas centradas na figura do professor. Se assim o fizéssemos, nada estaríamos acrescentando para a renovação do processo educacional.

Este trabalho de pesquisa que ora se apresenta, na verdade, é um relato de experiência, que por nós foi vivenciado em todos os seus estágios. Podemos dizer que se trata de uma dupla pesquisa. A primeira elaborada pelo professor para o conhecimento da realidade de sua clientela – os alunos – com todas as suas expectativas e / ou limitações de ordem cultural. A segunda, executada pelos próprios alunos que buscaram, através da pesquisa, informações necessárias à elaboração de seus trabalhos em sala de aula.

Entretanto, visto desta forma, esta segunda etapa parece que se trata apenas de uma pesquisa de biblioteca, resumindo-se a uma revisão literária acerca de temas relacionados à cultura popular brasileira. Se o leitor deste trabalho assim conceber tal idéia, não estará de todo equivocado. Assumimos que também se trata de revisão literária, muito embora não se limite a isto. O mérito deste trabalho – e que só agora podemos enxergar com maior clareza – é que conseguimos romper, através de nossa própria vivência (representada aqui por esta pesquisa) com o ensino formal, verticalizado, permitindo ao aluno sair de uma posição de passividade representada pela aula nos moldes da preleção, para atuar ativamente, através da pesquisa direta e indireta, nos conteúdos a serem trabalhados.

Embora a informação por eles selecionada possa lhes servir como bagagem cultural, o sentido desta última extrapola o simples acúmulo de informações. Ao se lançar no ato da pesquisa, o aluno que é estimulado, ávido por informações, detém em suas mãos uma nova concepção de ensino, mesmo que de imediato não se dê conta disso. A pesquisa, e não simplesmente a pesquisa pela pesquisa, aquela de biblioteca, descompromissada da análise-crítica dos conteúdos, propicia ao aluno uma tomada de consciência, uma redefinição do que é ensinar/aprender, num processo dialético onde um não existe sem o outro.

O aluno que aprende também tem muito a ensinar. Talvez esta tenha sido a nossa maior lição. As dificuldades apresentadas, as limitações e deficiências da própria escola e da estrutura educacional do estado e do país, e sobretudo a superação destas dificuldades na formação de seus conhecimentos, na decodificação dos códigos culturais, mas essencialmente a descentralização da aula na figura do professor que “tudo sabe e ensina”, mostrou que aquilo que é tão defendido por pedagogos, educadores e pesquisadores da área educacional, com essa visão de ensino inovado, também pode ser implementado em nossa prática em sala de aula.

Se analisarmos bem de perto os resultados colhidos com este trabalho de pesquisa, e aqui não nos referimos exclusivamente aos resultados da apresentação propriamente dita, mas ao significado desta pesquisa enquanto prática pedagógica, enquanto instrumento de análise crítica para os próprios alunos – futuros professores – em formação, seria lícito dizer que conseguimos alcançar com êxito os nossos objetivos.

Bibliografia

ALMEIDA, A.B. Educação Estético-visual no ensino escolar. Lisboa:Horizonte Ltda., 1980.
ARANTES, A.A. O que é cultura popular. São Paulo:Brasiliense, 1981. P. 7.

BEISIEGEL, C. R. A Cultura de Povo. São Paulo:Editora Cortez, 1985. P. 41.

CALDAS, W. O que todo cidadão precisa saber sobre cultura. São Paulo:Global, 1986.

CARVALHO, J.J. Seminário Folclore e Cultura popular. Série encontros e estudos. Rio de Janeiro: IBAC, 1992. P. 23.

CARVALHO N.P. Folclore e educação. São Paulo:Forense/Universitária/Salamandra, 1981. P. 6-7.

COTRIM, G. Fundamentos da Filosofia para uma geração consciente: elementos da história do pensamento ocidental. São Paulo:Saraiva, 1987. P. 100-101.

DEMO, P. Pesquisa :princípio científico e educativo. São Paulo:Cortez, 2001. P. 95.

DUARTE Jr., J.F. Por que arte-educação? Campinas:Papiros, 1986. P. 56.

FRADE, C. Folclore. São Paulo:Global, 1991.

LAKATOS, E.M; MARCONI, M.A. Fundamentos de Metodologia Científica. São Paulo:Atlas, 1991. P. 270.

MARTINE, J. Introdução à análise da imagem. Campinas:Papirus, 1996.  P. 47.

MEGALE, N.B. Folclore Brasileiro. Rio de Janeiro:Vozes, 2000. P. 12.

RICHTER, I.M. O pensamento visual e sua relação com a comunicação visual no processo de aprendizagem. RGS - Revista do Centro de Artes e Letras.  Jan/dez 1998.

Notas:

[1]Rose Mary Aguiar Borges – Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro; Professora do Instituto de Educação de Nova Friburgo Licenciada em Educação Artística. Especialista em Planejamento Educacional. Nova Friburgo – RJ, Brasil.
[2]João Henrique Verly Serrão – Orientador. Professor em Língua e Literatura Francesas. Professor de Metodologia da Pesquisa Científica. Mestre em Odontologia Social e Preventiva pela Universidade Federal Fluminense. Niterói – RJ, Brasil.

Revista Digital Art& - ISSN 1806-2962 - Ano II - Número 02 - Outubro de 2004 - Webmaster - Todos os Direitos Reservados

OBS: Os textos publicados na Revista Art& só podem ser reproduzidos com autorização POR ESCRITO dos editores.