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Editora Responsável: Prof.ª Me. Itamar Alves Leal dos Santos.

“A Morte do Boi no Terreiro de Mina Pedra da Encantaria”

Na Editoria de Evento Comentado da Revista Art& mantenho um diálogo franco entre a arte educadora e a participante empolgada com o evento “Morte do Boi no Terreiro de Mina Pedra de Encantaria” em Maiobão, bairro de São Luis – MA, em 03 de julho de 2005.

Quando mudei de São Paulo – SP para São Luis – MA, nunca me imaginei participando de uma cerimônia num Terreiro de Mina[1], principalmente, porque não conhecia nada sobre a prática religiosa, muito menos, compartilhar de todo processo da Morte do Boi ou melhor da Morte dos Bois, pois são vários bois que são mortos durante a cerimônia.

A festa que participei aconteceu para homenagear uma Entidade, um Encantado, no caso deste ano foi a Cabocla[2] Ita[3], e o Boi que ela ofertou foi Prenda de Don João.

Notamos na foto, a Dona da Festa Cabocla Ita, a Kátia, estava dançando mas ainda não havia recebido a Entidade. Veja a exuberância de cores e movimentos que acontece. No centro ao fundo da foto podemos notar o Boi que foi feito pela Dona da Festa. Do lado direito, com roupa verde temos a presença de José Itaparandy – Pai de Santo do Terreiro. Na parede ao fundo as imagens dos santos católicos.

Sempre residi longe do Nordeste, nunca aprofundei estudos sobre o tema Bumba Meu Boi, o que pode demonstrar pouca cultura e até mesmo pouco acesso a informações. Sempre imaginei que o Bumba Meu Boi fosse uma apresentação folclórica, como outras que acontecem por todo o nosso país. Quando falo em “uma apresentação folclórica”, em momento algum quero menosprezar a cultura de nosso país, muito pelo contrário, demonstro aqui a falta de informação que normalmente acaba por atingir muitos professores inclusive professores de Arte que trabalham com folclore em seu cotidiano. Imaginava que fosse uma “brincadeira”, que tivesse uma “bela história” por trás mas somente uma história. Conforme o estado que a manifestação acontecesse tomasse suas peculiaridades, mas somente influenciada pela localidade. Nunca imaginei que tivesse um cunho religioso e um sincretismo[4] religioso onde pudéssemos encontrar não somente a benção para o objeto ali exposto, no caso o Boi, mas também a entrega deste Boi em uma cerimônia riquíssima de detalhes.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Acompanhe as imagens e note alguns desses detalhes:

Os participantes se movimentam, descalços, em chão de terra, em forma circular como uma ciranda. Alguns giram rapidamente, outros caminham. Existe exuberância de cor e movimento entre os participantes. Encontramos nas paredes imagens dos santos católicos.

Detalhe do bordado do lombo do boi que foi bordado no veludo com canutilhos e miçangas coloridas conforme o pedido de cada Dono (o Encantado que diz o que quer que seja bordado em seu Boi).

Participantes dançando, carregam suas prendas, como oferenda.

Encontramos nas fotos, Bois de diferentes tamanhos, de diferentes tecidos. Bordados detalhadamente. Uma obra minuciosamente bordada e cuidada. Depois de confeccionada é conduzida até o Terreiro e de lá não pode mais sair.

Vários bois descansando, enquanto os participantes dançam.

O movimento do encantado que está dançando no centro da imagem, vestido de Branco, é tão rápido que parece flutuar. Enquanto na imagem anterior podemos notar as pessoas em movimento, todavia bem mais lento.

No final da festa, depois que todos os Bois são mortos, existe a distribuição dos presentes entre todos os que participaram da cerimônia. Nesta foto eu estou sendo presenteada pelo Encantado Joãozinho, com uma matraca. Seguro um chapéu com bombom, que fazia parte do Mourão da Morte do Boi [5]que ganhei do Pai de Santo Dono da Casa – Encantada Terezinha Légua – José Itaparandi.

1 - Local onde o Boi será Morto, onde acontecerá a oferenda.

2 - O Boi já está deitado, com a cabeça sobre a bacia onde o “sangue” será coletado.

3 - O Boi começou a ser Imolado, o “sangue” começa a cair na tigela.

4 - O Boi já está morto, e o “sangue” está na tigela (sangue = “vinho”)

5 - Outra imagem do Boi já morto, onde podemos notar o “couro do boi” , a tigela com o “sangue” e a imagem do Santo.

6 - Detalhe da imagem do Boi já morto, onde podemos notar as facas que foram usadas para a cerimônia.


[1] Terreiro de Mina: “como o candomblé, o tambor de mina é uma religião de transe e possessão, na qual entidades são evocadas por cânticos e danças, executadas ao som de tambores.” Série de TV Mostra o Alfabeto Coreográfico do Brasil. Folha OnLine Ilustrada, 20/06/2005. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u51443.shtml visitada em 27/06/2005.

[2] Caboclo também pode ser chamado Encantado. Em cada ano no Terreiro é escolhido pelo “Caboclo Maior” – Dono da Casa, um “Dono da Festa” que neste ano foi a Cabocla Ita, que tudo que acontece durante a festa é para agradar a Dona da Festa. A Festa do Boi acontece durante três dias no mês de junho, sendo que no dia 29 é o ápice da festa, os Caboclos baixam e dançam com os Bois na porta do Terreiro, e estes Bois à partir desta cerimônia partem para a rua, se apresentam para o Caboclo e deixam o local para que outras brincadeiras aconteçam. A morte do boi, em 2005, no Terreiro de Encantaria aconteceu no dia 03 de julho, primeiro domingo de julho. Nesta foto podemos encontrar vários bois durante a cerimônia.

[3] Cabocla Ita, usa vestido vermelho estampado, e o Boi  Prenda de Don João, está no centro da imagem.

[4] FERRETTI, Sérgio F. ”Notas sobre o sincretismo religioso no Brasil - modelos, limitações, possibilidades”. Apude DROOGERS, André. “Syncretism: The Problem of Definition. The Definition of the Problem”, GORT, J.; VROOM, H.; FERNHOUT. R. and WESSELS, A. (eds) Dialogue and syncretism.: An interdisciplinary approach. Amsterdam, W. B. Eerdmans Publishing Co. and Ed. Rodopi, pp. 7-25, 1989 “[....] o termo sincretismo possui duplo sentido. É usado com significado objetivo, neutro e descritivo, de mistura de religiões, e com significado subjetivo, que inclui a avaliação de tal mistura [....]. Visitado em < http://www.ufma.br/canais/gpmina/Textos/7.htm#_ftn4 > disponível em 25/09/2005.

[5] Mourão da Morte do Boi: monumento que foi montado no centro do terreiro, local onde os bois eram sacrificados, com diversos presentes para serem distribuídos.

Revista Digital Art& - ISSN 1806-2962 - Ano III - Número 04 - Outubro de 2005 - Webmaster - Todos os Direitos Reservados