voltar ao menu de textos

Instrumento de Mediação e Análise Crítica de uma Imagem
Autoras:Teresinha Sueli Franz[1] - terefranz@udesc.br e Thais Paulina Gralik[2] - thaisgralik@onda.com.br

Resumo:

Apresentamos uma proposta de Instrumento de Mediação e de Análise Crítica de uma imagem de história em quadrinhos dirigido a professores e estudantes do ensino fundamental. O estudo se fundamenta na relação entre a Pedagogia Crítica da Arte e Cultura Visual e Educação. Coerente com as teorias pós-modernas do ensino da arte, levamos em conta a produção e transformação das subjetividades, a fragmentação e a pluralidade de pensamentos produzidos pelo contato incessante com o mundo das imagens. De acordo com o enfoque adotado, uma imagem de histórias em quadrinhos é aqui abordada como um fenômeno sociocultural. Segundo essa perspectiva, um processo consciente de problematização, pesquisa e reflexão sobre as imagens da cultura visual pode levar a uma compreensão crítica e autônoma da realidade sociocultural.

Palavras Chave: Análise Crítica, Cultura Visual, Mediação, Problematização.

Abstract: We are presenting a proposal of an Instrument of Mediation and Critical Analysis of a cartoon image to teachers and students of the Basic School. This study is based on the relation among the Critical Pedagogy of the Art, the Visual Culture and Education. Coherent with the post-modern theories of the art teaching, taking in consideration the production and transformation of the subjectivities, the fragmentation and the plurality of thoughts produced by the incessant contact with the vast world of images. Coherent with the focus used here, an image of cartoons is approached as a social cultural phenomenon. According to this perspective a conscious process of problematization, research and reflection of the images from the visual culture, can result into a critical and autonomous understanding of the social cultural reality.

Key words: Critical Analysis, Visual Culture, Mediation, Problematization.

Introdução

O presente Instrumento de Mediação e de Análise Crítica de uma imagem de história em quadrinhos foi elaborado fundamentando-se nos estudos realizados por Franz (2003a). É dedicado aos professores interessados em desenvolver estudos sobre a análise crítica de imagens da indústria do entretenimento com estudantes do ensino fundamental. O Instrumento de Mediação, inicialmente elaborado pela autora citada em torno de uma pintura histórica do século XIX brasileiro, é referência para realizar estudos críticos sobre outras imagens da Cultura Visual. Fundamenta-se em uma conscienciosa associação entre Pedagogia Crítica da Arte e os Estudos sobre a Cultura Visual e Educação, tendências que segundo os autores a seguir citados se fundem nas abordagens pós-modernistas do ensino das artes visuais (Giroux, 1997; Cary, 1998; Hernández, 2000 e 2003; Efland, Freedman e Sthur 2003; Franz,2004, 2003a, 2003b e 2003c). A meta final é promover uma compreensão profunda e a necessária consciência crítica sobre o poder das representações visuais na construção de identidades. Essa perspectiva fundamenta-se também nas teorias de Hernández (2000 e 2003), para quem a função da escola não é somente transmitir conteúdos, mas também facilitar a reconstrução crítica das subjetividades de crianças e adolescentes.

Para Franz (2003b), desenvolver habilidades de interpretação crítica de imagens é considerado por muitos teóricos a principal meta do ensino em arte hoje. Essa perspectiva, geralmente compreendida nos estudos em torno das obras de arte erudita, estende-se também às imagens da cultura popular e ao universo visual cotidiano, profundamente transformado pelas novas tecnologias da informação e da comunicação.

Aparentemente inócuas, presentes nas horas de lazer, as imagens impregnam o cotidiano das crianças e adolescentes sem que seja dado o devido valor informativo e formativo a elas. Imagens que constroem visões sobre a realidade, transmitem valores e crenças e modificam a maneira de pensar e atuar no mundo. Mas as crianças e adolescentes dificilmente conseguem entender isso sozinhas Franz (2003c).

Facilitar essa complexa tarefa em contextos de estudos na escola é objetivo do Instrumento de Mediação. Ele pode ser uma ferramenta para ajudar o professor e os estudantes a mediar a construção da compreensão desejada sobre o mundo das imagens. Uma vez que se apóia nas abordagens socioculturais, pode levar a uma compreensão crítica da sociedade e da cultura. Para que essa compreensão aconteça, o estudo não se detém no plano físico da imagem, mas pretende identificar as conexões desta com seu contexto social e cultural de produção e a relação dos significados encontrados com o mundo pessoal e social do estudante, em sintonia com as abordagens contemporâneas de educação.

O processo de construção da compreensão crítica que possibilita o Instrumento de Mediação parte do princípio de que "uma pergunta que não problematiza, não ajuda a compreender" (Hernández, 2003a, p. 10). Portanto, as perguntas elaboradas para o Instrumento de Mediação de Análise Crítica não podem servir apenas para que os alunos digam o que vêem. Elas devem ajudar os estudantes a ir além da identificação pura e simples do que está aparente na imagem, indo ao contexto de produção e ao contexto de recepção, fazendo uma relação com o mundo pessoal e social do educando.

Procedimentos

Franz (2003b) sugere que os educadores abordem os estudos em torno da compreensão de imagens a partir da perspectiva sociocultural, onde podem ser considerados diferentes âmbitos de pesquisa e análise (âmbito biográfico, âmbito estético/artístico, âmbito histórico/antropológico e âmbito crítico/social), a fim de se construir uma compreensão mais holística e complexa das imagens. A autora citada acrescenta ainda o âmbito pedagógico, que é principalmente de interesse do professor. O domínio sobre o Instrumento de Mediação permite que se organize um trabalho em etapas, que facilitam o aprendizado dos estudantes.

Um detalhe importante e que não pode ser esquecido é o fato assinalado por Franz (2003b, p.1), de que os diferentes âmbitos de compreensão não aparecem de modo seqüencial e ordenados na compreensão de uma imagem, mas sim interligados, porque eles são interdependentes. As inter-relações entre esses âmbitos chamam a atenção para a necessária interdisciplinaridade e transdisciplinaridade da compreensão crítica da Cultura Visual (Hernández, 2000).

Nesse trabalho, professor e estudantes se envolvem em processos de pesquisas, superando velhas posturas pedagógicas herdadas da Escola Tradicional, da Escola Nova e da Escola Tecnicista no ensino da arte. Aqui, "o professor passa de transmissor a mediador e a organizador do processo de estudos" (Franz, 2003c, p. 2). Na medida em que se trabalham os âmbitos de compreensão, os níveis de interpretação vão ficando mais coerentes e complexos, de modo que não estabelecemos um prazo predeterminado para a duração e conclusão do trabalho com o Instrumento de Mediação, tampouco um nível ideal de compreensão. Isso dependerá das intenções e planejamento do professor e da classe, de acordo com os objetivos desejados. Ou seja, o nível e a profundidade dos estudos estarão sujeitos ao interesse e necessidades do contexto de estudos.

O primeiro momento envolve a escolha da imagem. A partir dessa escolha, o professor parte para o início do planejamento do processo de estudos em torno dela (Âmbito Pedagógico). Como em todo processo de ensino, é necessário pensar na avaliação da aprendizagem. Nesse caso, se propõe que seja realizado em diferentes etapas, seguindo, por exemplo a Hernández (2000):

1) Avaliação inicial ou de sondagem;
2) Avaliação de processo;
3) Avaliação Final. O quadro a seguir representa a seqüência das etapas de trabalho:

 

A Imagem: Heróis Renascem Vingadores?

A imagem escolhida que aqui se propõe para ser trabalhada pelo Instrumento de Mediação de Análise Crítica está em uma página dupla da revista mensal (nº 5) “Os Heróis Renascem Vingadores”, publicada em abril de 1999 pela Editora Abril, Divisão Jovem. A revista é propriedade da Marvel Entertainment Group. Não possui numeração de páginas. Apenas para efeito de análise, denominamos aqui como páginas quatro e cinco da revista. Dimensões: 33,7 x 25,7cm.

A escolha recaiu sobre essa imagem devido ao fato de sua temática estar relacionada a problemas atuais, tais como disputas entre poderes, lutas e violência. Mostra dois personagens, Thor e Hulk, que fazem parte do cotidiano de crianças e adolescentes, sendo bastante conhecidos do público infanto-juvenil. Além de sua presença constante em revistas, esses personagens são encontrados em páginas da Internet, videogames e em forma de bonecos, que crianças utilizam para simulação de lutas em brincadeiras. Apesar do convívio intenso promovido pelas mídias, não nos detemos para saber quais os significados que trazem e o que significam para esse público. Ao trabalhar com uma imagem da indústria do entretenimento ou que envolva a linguagem dos quadrinhos, o professor de Artes pode auxiliar o aluno a interpretar criticamente o que as mídias apresentam. Reiteramos que o Instrumento de Mediação que aqui apresentamos pode mediar a compreensão sobre o papel que essa imagem (ou outra semelhante, a critério do professor) tem na construção das identidades, idéias, valores e crenças de seus alunos, quais as verdades que apresenta e quais esconde, e os interesses e relações de poder que reproduz.

Fig. 1: Imagem da Revista nº 5 "Heróis Renascem Vingadores?" (páginas 4 e 5)

Âmbitos de Compreensão

Dá-se início ao trabalho pelo Âmbito Pedagógico. Ordenar as perguntas permite que se construa um referencial para o desenvolvimento do trabalho. Novas perguntas poderão surgir conforme o andamento dos estudos e as necessidades do grupo. Incentivamos o professor a fazer a si mesmo algumas perguntas antes de iniciar o trabalho com os alunos:

1. O que espero que os alunos aprendam com essa imagem?

2. Quais informações buscar para contextualizar os estudos?

3. Quais informações transformarão o estudo dessa imagem em aprendizado e conhecimento para os estudantes?

4. Quais as estratégias didáticas adequadas para o nível dos alunos e objetivos propostos?

5. Que outras imagens e textos podem auxiliar na compreensão?

6. Como saber se os alunos estão compreendendo, e como ordenar e avaliar a compreensão sobre a imagem?

7. O que dizer e fazer ao apresentar a imagem?

8. Esta imagem será suficiente para visualização conjunta em sala?

9. Qual a melhor maneira possível para que os alunos possam visualizar?

10. A escola, outros professores, pessoas da comunidade ou os estudantes podem colaborar trazendo outras imagens que auxiliem a desenvolver a compreensão planejada?

O professor deve iniciar fazendo uma pesquisa prévia sobre a imagem. Isso facilita o processo de mediação. Por outro lado, ele também pode pesquisar e aprender junto com o grupo de estudantes, formando com eles uma comunidade de investigação, como ensina Fernando Hernández (2000). Apresentar a imagem para os alunos significa ter um momento para que possam fazer uma observação atenta inicial. Nessa etapa, é possível questionar os alunos quanto ao conhecimento que já possuem a respeito dos personagens ou da revista. Podemos aprofundar a observação da imagem fazendo algumas perguntas relacionadas com ela.

1. Conhece esses personagens?

2. Conhece alguém que gosta desses personagens?

3. O que pensa a respeito deles?

4. Onde costumam aparecer?

5. O que chama mais atenção nessa imagem?

6. O que os personagens estão fazendo?

7. Quais suas idades? De onde eles são?

8. Quais suas aparências?

9. Qual é a história que estão contando?

Ao final desse momento, pode-se pedir aos alunos que escrevam um texto sobre a imagem. Esse registro pode servir como Avaliação Inicial ou de Sondagem.

Âmbito Crítico Social

Nesse âmbito, procura-se entender como a imagem pode ajudar na compreensão de temas e problemas da sociedade à qual a imagem e espectador estão vinculados, porque nesse estudo as imagens da arte, e neste caso de HQ[3], são compreendidas como representações da sociedade e da cultura. "As perguntas devem ser contextualizadas para a sociedade da época" em que a imagem/revista foi produzida (FRANZ, 2003c), relacionando os significados desse contexto com a vida do aluno (contexto de recepção). O trabalho deve ajudar o aluno a compreender o meio social e cultural em que vive, de forma reflexiva e crítica. Essa é a meta dos estudos em artes visuais em que a arte é compreendida como uma representação sociocultural (Franz, 2003a; Hernández, 2000; Efland, Fredman e Sthur, 2003; Chalmers, 2003 e Cary, 1998).

As perguntas devem ajudar os alunos a sair do nível ingênuo de compreensão, para superar as respostas de senso comum (Franz, 2003).

  • Que poderes os personagens Thor e Hulk estão representando?
  • Que ideologias presentes na nossa sociedade estão representadas através de cada um desses personagens?
  • Existe uma presença feminina no grupo de personagens da revista? Qual é o papel dessa presença?
  • Qual a função da violência nesses desenhos?
  • Quais as influências da cultura americana atualmente no mundo?
  • Qual a influência dessa cultura em nossa sociedade? Afeta nosso estilo de vida, nossas idéias, comportamentos e o que pensamos sobre nós?
  • Cenas semelhantes acontecem na realidade?
  • Onde encontramos cenas semelhantes a essa imagem em nossa sociedade?
  • Quais os tipos de guerra que são produzidos em nossa própria sociedade?
  • Quais os efeitos da violência para uma sociedade?

Âmbito Histórico/Antropológico

Na história da Cultura Visual, existem motivos e intenções para que se fabriquem produtos para entretenimento. Histórias em quadrinhos são adquiridas principalmente para divertir e entreter. Por trás disso está o poder do mercado. Através de seus personagens, as histórias em quadrinhos retratam situações vividas ou revelam anseios e desejos com os quais os leitores se identificam, de modo que histórias e personagens refletem valores, crenças e ideologias de seus autores, editoras ou grupos. Valores, crenças e ideologias que nem sempre estão evidentes na imagem. Como objetos artísticos, as imagens da Cultura Visual também possuem funções e significados implícitos elaborados pela própria sociedade que a produziu.

As perguntas aqui apresentadas têm como objetivo fazer com que os professores possam auxiliar os alunos na compreensão do contexto cultural que a imagem/revista foi produzida e a relação desse contexto com os significados da imagem.

  • Qual editora produz essa revista?
  • Onde se localiza, e há quanto tempo existe?
  • Quais são os valores, crenças e ideologias veiculados através dos personagens da revista?
  • Quem são as pessoas que produziram essa revista?
  • Em quais lugares o autor (ou autores) se inspirou para criar os cenários dessa revista?
  • Quais as estratégias que a revista utiliza para manter e vender seus produtos aos leitores?
  • Por que existem 4 títulos de revista nessa mesma série?
  • Por que compramos esses produtos?
  • As idéias veiculadas pela revista interessam para nossa sociedade? Por quê?

Âmbito Biográfico

O trabalho nesse âmbito faz uma aproximação com o aluno, relacionando sua vida com a imagem, considerando a influência das imagens da Cultura Visual na construção da identidade, formação de valores e crenças. Procura resgatar a unidade entre história e sujeito, conectando o ensino e a aprendizagem da arte com uma prática pedagógica que visa alcançar a cidadania e autonomia do aluno (Franz, 2003b).

Os alunos devem ser incentivados a questionar suas próprias biografias e modos de vida para que possam refletir e analisar seu próprio meio. As perguntas podem ajudar o aluno a compreender qual o papel que a imagem possui em suas vidas, relacionando os significados encontrados na imagem com sua história pessoal, procurando em sua própria vida referências que o ajudem a interpretar a obra (Franz, 2003d, p. 5). Além das perguntas que colocamos, o professor pode elaborar outras, de acordo com as necessidades da situação.

  • Conheço, leio ou assisto desenhos animados com esses personagens?
  • Imito ou já imitei esses personagens?
  • Como é que alguém é levado a pensar que os norte-americanos seriam “super-poderosos”?
  • De que modo eles defendem seus interesses?
  • Quais os significados encontrados na imagem que influenciaram meu modo de vida?
  • Como vejo as atitudes representadas por esses personagens nessa imagem?
  • Como o personagem Hulk é visto pelos outros membros do seu grupo?
  • Onde costumo encontrar desenhos com esses personagens?
  • Como a violência interfere em minha sala de aula, escola ou minha vida?
  • Como pessoas que promovem situações violentas são vistas pela sociedade? Como eu vejo essas pessoas?
  • Por que você acha que as pessoas agem dessa maneira?
  • O que penso sobre a violência?
  • O que posso aprender com essa imagem?

Âmbito Estético/Estilístico

Obras de arte são sistemas de representações nos quais estão embutidos códigos simbólicos, referências culturais, influências de outros artistas, tendências estilísticas, etc. (Franz, 2003c). Apesar de terem um lado fortemente comercial, as histórias em quadrinhos contêm determinados códigos aceitos por determinados grupos e são também produtos de uma época e um lugar. Essas histórias podem pertencer a gêneros diferentes, tais como fantasias de superpoder, autobiografias, ficção científica, aventuras, terror, etc. Possuem também estilos diferentes. O gênero super-heróis, por exemplo, possui características estilísticas próprias, que levaram décadas para serem incorporadas (McCLOUD, 2006).

Em geral, muitas pessoas trabalham para que uma revista de histórias em quadrinhos possa ser produzida. Com a colaboração de Jack Kirby, Stan Lee criou os personagens Hulk, Thor e outros que fazem sucesso até hoje. Profundo conhecedor de técnicas cinematográficas e de noções dinâmicas da perspe ctiva, Jack Kirby passou a inovar nos quadrinhos. Antes dele, poucos artistas o fizeram. As primeiras histórias em quadrinhos utilizavam quadros e planos invariáveis (Quella-Guyot, 1994). A partir de então, as histórias em quadrinhos que se mantinham presas a seqüências simples passaram a fazer uso de splash pages e páginas duplas[4]. Nessa revista, o argumento foi criado por Rob Liefeld e os desenhos pela dupla Rob Liefeld e Ian Churchill. As perguntas podem seguir mais ou menos assim:

  • O que foi desenhado nessa cena?
  • De que maneira  foram desenhados os personagens?
  • Qual o estilo utilizado pelo desenhista? (Minimiza, estiliza, exagera traços e expressões, etc.)?
  • Como o desenhista faz uso dos ângulos e enquadramentos nessa imagem ?
  • Quais são as características físicas dos personagens?
  • Quais os elementos usados na imagem que dão expressão à cena?
  • Qual a função das cores vermelho e verde nessa imagem? E o amarelo?
  • O que o desenhista que criou essa cena precisava saber para poder desenhá-la? Quais materiais ele usou?
  • Para desenvolver uma compreensão mais complexa sobre esse âmbito, é interessante fazer visitas a ateliês de criação gráfica ou editoras, onde são desenvolvidas produções de histórias em quadrinhos. Para que os alunos compreendam como são realizadas, pode ser interessante receber visitas de profissionais que costumam divulgar seus trabalhos em escolas. Após esse percurso, é importante partir para um trabalho prático de produção de histórias em quadrinhos com os estudantes. O fazer artístico é uma excelente estratégica de compreensão.

Delimitar os estudos práticos pode facilitar a tarefa de desenvolver um corpo básico de conhecimentos na linguagem dos quadrinhos, de modo que o aluno aprenda elementos suficientes para empregar esse conhecimento na prática.

O Processo de Avaliação

Conforme Franz (2003a), as interpretações dos significados de uma obra/imagem apresentam diferentes níveis de complexidade, indo das mais superficiais, parciais, fragmentadas e errôneas até as de nível superior, mais holísticas, críticas e complexas. Após a realização de estudos sobre a compreensão crítica de uma obra de arte, ela apresenta quatro níveis de interpretação: ingênuo, principiante, aprendiz e especialista.

“Descobrir o estágio em que uma pessoa se encontra não implica classificar esse indivíduo, mas sim situar o 'lugar' em que se encontram suas idéias em torno da temática que se aborde em cada caso", diz Hernandez (2000, p. 113), para que o professor possa auxiliar o estudante no desenvolvimento da compreensão desejada. O estudo pode se estender por semanas. Todo o trabalho deve ser acompanhado por um processo contínuo de avaliação. Ao final, também é necessário realizar uma avaliação somativa. Hernandez (2000) sugere que a avaliação final deve ser feita não no sentido que implique medir êxitos ou fracassos, mas como um meio que sirva para que os professores possam "avaliar sua própria tarefa de mediar a compreensão e o progresso ou as dificuldades dos alunos"(p.150).

O professor pode também solicitar um trabalho prático com a linguagem dos quadrinhos, para fins de avaliação final. Simulando uma situação que exija a resolução de um problema, pode propor a criação de uma história em quadrinhos que envolva as habilidades práticas trabalhadas e o senso crítico desenvolvido durante o trabalho com os âmbitos de compreensão.

Considerações Finais

O Instrumento de Mediação de Análise Crítica aqui proposto está em sintonia com as finalidades educacionais pós-modernas, de conectar o universo cotidiano do aluno com a escola. Tenta preencher uma lacuna entre o que se ensina na escola e o que se aprende fora dela. Através de uma abordagem crítica, o Instrumento de Mediação e de Análise da imagem pode favorecer uma abordagem consciente dos estudantes sobre si mesmos e do mundo do qual fazem parte.

Sem negar os conteúdos, o Instrumento de Mediação aqui proposto pode ser um caminho para torná-los mais significativos para os alunos. Incluindo as imagens da Cultura Visual, não apenas expande o conhecimento, mas a visão dessa cultura, de seus significados e sua realidade, para desenvolver uma compreensão crítica sobre quem somos, sobre a vida que levamos e sobre o mundo em que vivemos. É uma proposta aberta e flexível, que pode ser desenvolvida e aplicada pelos professores e estudantes em diferentes situações do Ensino das Artes Visuais.

Referências Bibliográficas

CARY, R. Critical Art Pedagogy: Fondations for Postmodern Art Education. New York and London: Garland, 1998.

CHALMERS, F.G. Arte, educación y diversidad cultural. Barcelona: Paidós, 2003.

EFLAND, A.; FREEDMAN, K. e STUHR, P. La educación en el arte posmoderno. Barcelona: Paidós, 2003.

FRANZ, T.S. "Os desafios para uma educação Pós-Moderna". Cadernos de Texto da Funarte - Programa Arte sem Barreiras, Rio de Janeiro, v.4, 2004 (site online)

________. Educação para uma compreensão crítica da Arte. Florianópolis: Letras Contemporâneas, 2003a.

________. "O Significado da interpretação crítica de uma obra de arte". Revista Pátio. Porto Alegre: Artes Médicas, v.28, 2003b.

________e GENTILLE, P. "Para ler e entender videogames". Revista Nova Escola, São Paulo, v.161, abril 2003 In: www.novaescola.com.br, 2003c

GIROUX. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.

HERNANDEZ, F. Cultura Visual, Mudança Educativa e Projeto de Trabalho. São Paulo: Artes Médicas, 2000.

­­­________. “Ir além da visão e da satisfação: a educação para a compreensão crítica da cultura visual. In: Educação para uma compreensão crítica da Arte. Florianópolis: Letras Contemporâneas, 2003a.

Marvel Comics. Heróis Renascem Vingadores? "...Que o homem não separe!" São Paulo: Editora Abril, nº 5, abril 1999.

McCLOUD, S. Desvendando os Quadrinhos. São Paulo: M.Books, 2005.

QUELLA-GUYOT, D. A história em quadrinhos. São Paulo: Edições Loyola, 1994.

Notas:

[1] Professora de Ensino de Artes Visuais do CEART/UDESC. Coordenadora do grupo de pesquisa: “Arte, Ensino e Pedagogia Crítica”. Licenciada em Educação Artística: Artes Plásticas (UDESC). Mestre em Educação/Arte e Educação (UFPR). Doutora em Belas Artes (UB Barcelona/Espanha). Autora de diversas publicações no Brasil e no exterior, entre elas os livros: “Educação para uma compreensão crítica da arte”. Fpolis: Letras Contemporâneas, 2003 e “Educação para a compreensão da arte: Museu Victor Meirelles”. Fpolis: Insular, 2001.

[2] Mestranda do Curso de Pós-Graduação em Artes Visuais na UDESC-SC. Desenvolve pesquisa na área do Ensino de Artes e suas relações com a Arte Seqüencial/ HQ, com a orientação da Prof.ª Drª Teresinha S. Franz. Professora e Artista Plástica, atua em escolas de Ensino Fundamental e Médio de Curitiba. Participou de diversas Coletivas e Salões de Artes Plásticas no Estado do Paraná e Santa Catarina. Experiência com Design Gráfico em jornal e agências de propaganda. Realiza trabalhos de criação, tiras humorísticas e cenários para espetáculos de Escola de Dança.

[3] Histórias em quadrinhos.

[4](ver também - http.//www.devir.com.br/marvel/autores_stanlee.php Acesso em 24.02.06).

 

Revista Digital Art& - ISSN 1806-2962 - Ano IV - Número 06 - Outubro de 2006 - Webmaster - Todos os Direitos Reservados

OBS: Os textos publicados na Revista Art& só podem ser reproduzidos com autorização POR ESCRITO dos editores.