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A Colagem como Possibilidade Artística em Sala de Aula
Autora: Juliana Rossi - julirossi@gmail.com

Resumo: Esse artigo relata a experiência da docência necessária para a obtenção parcial do grau de Licenciatura do curso de Artes Visuais da Univille – Universidade da Região de Joinville, no ano letivo de 2006, apresentada no trabalho que possui como temática principal “A colagem como recurso poiético no ensino da arte”, efetivada através de estágio no Ensino Fundamental e no Ensino Médio, na Escola Estadual Dom Pio de Freitas. Será apresentada a temática da colagem; conceitos de produção artística e referências históricas, com o intuito de localizar o leitor quanto ao conhecimento da colagem como importante ferramenta artística e identitária, reconhecendo-a como uma possibilidade de expressar-se e ampliar o sensível. A importância da arte na educação é exposta ao leitor, segundo importantes pensadores e arte-educadores como Efland (2005) e Almeida (2001). Há ainda as principais reflexões resultantes durante o Estágio Curricular Supervisionado, demonstrando que as práticas de Estágio são de extrema importância para o acadêmico que está prestes a concluir o Ensino Superior, pois é a partir da vivência prática que a experiência é adquirida e há a preparação para a atuação profissional.

Palavras-chave: colagem, arte-educação, ensino, montagem, recorte.

Abstract: This article tells the experience of teaching, needed for the partial attainment of the major of Visual Arts teacher from the course of Visual Arts of Univille – Universidade da Região de Joinville, in the school year of 2006, presented in the work that possess as main thematic “The collage as poiethic resource in art-education”, accomplished through period of training in Junior High and High School, in the Basic School Dom Pio de Freitas. The thematic of collage will be presented; concepts of artistic production and historical references, with intention to locate the reader how much is important the knowledge of collage as important artistic and identity tool, recognizing it as a possibility to express themselves and to extend the sensitiveness. The importance of art in the education is displayed to the reader, by important art-educators as Efland (2005) and Almeida (2001). There are still the main resultant reflections during the Supervised Curricular Period of training, demonstrating that the practical periods of training are of extreme importance for the academic who is gives to conclude College, therefore are from the practical experience that the experience is acquired and has the preparation for the professional performance.

Key-words: collage, art-education, teaching, cut, paste.

Identidade e colagem

A identidade social de um indivíduo é caracterizada a partir do conjunto de vinculações que este possui em um sistema social: desde a classe social, sexual, até a uma nação, etc. Além da social, há a identidade cultural, que pode ser uma categorização de distinções entre as pessoas, baseada na diferença cultural (CUCHE, 2003); o meio, a trajetória de vida, as oportunidades e as experiências de um indivíduo o influenciam diretamente em escolhas e gostos particulares. A colagem auxilia nessa visão e reflexão identitária, pois, através do ato de recortar e colar, o indivíduo estará exercendo de modo artístico a sua identidade.

Com tesoura, cola e papel é possível fazer trabalhos que externalizam os sentimentos, pois o simples ato de recortar, colar e fazer composições com figuras de diferentes contextos denotam a identidade cultural e social do indivíduo e, até mesmo, dos gostos do próprio. Esses atos físicos podem ser um procedimento quando passam a contextualizar aquela figura já recortada em uma nova composição, criando um novo contexto que inicialmente parecia impossível e impensável para a figura em questão, tornando seu trabalho interessante e expressivo de sua identidade pessoal.

A identidade, portanto, não é uma herança biológica e sim social. O meio, a trajetória de vida, as oportunidades e as experiências de um indivíduo o influenciam diretamente em escolhas e gostos particulares. A colagem auxilia nessa visão e reflexão identitária, pois, através do ato de escolher, recortar e colar, o indivíduo exerce de modo artístico a sua identidade quando opta pela escolha entre certa figura ao invés de tantas outras, demonstrando seu modo de pensar e sentir, refletindo dessa maneira seus gostos.

Artistas como Hannah Höch (do movimento dadaísta) e Rubens Gerchman (da Pop Art brasileira) demonstram claramente que a colagem é uma importante ferramenta identitária e, muitas vezes, de rebeldia e protesto – no caso de Hannah Höch, que era inconformada com a maneira de como a mulher era retratada, e nas suas colagens essa era a principal temática.

Poiética e colagem

Paul Valéry (poeta francês) foi o primeiro a empregar o conceito de poïétique (poiética) no terreno das artes, em 1937, em um curso proferido no Collége de France. Afirmava que o termo não designava o estudo de obras concluídas ou em projeto, mas de obras no momento de sua instauração.

René Passeron, artista plástico e professor (aposentado) da Universidade Paris 1 – Panthéon – Sorbonne, estendeu o conceito a toda criação artística e propôs seu estabelecimento como disciplina independente da estética. Passeron (1996) afirma que “a estética, como a palavra indica, ocupa-se da sensibilidade, [...] enquanto a poiética se ocupa da ação”. Há então, “na poiética, um prolongamento filosófico sobre o terreno da ética. Na poiética, há problemas antropológicos e políticos dos quais a estética não se ocupa” [PASSERON apud ARAUJO, 1998].

Ao fazer uma obra, o artista precisa buscar na teoria o porquê de fazer isto ou aquilo, estabelecendo relações com a história da arte, além de especular com as implicações do que está sendo feito ou que já foi feito ao mesmo tempo em que pesquisa e produz seu objeto de estudo. A poiética submete-se, então, à possibilidade de trazer uma dimensão teórica à prática (REY, 1996). Segundo Rey (1996, p. 3) a poiética pode ser entendida como um “conjunto de estudos que abordam a obra do ponto de vista de sua instauração. [...] Interessa à obra enquanto ela está ‘em luta’ com o seu criador. É o modo de existência da obra à fazer”; leva em conta a constituição de significado enquanto a obra está sendo feita.

A poiética não é a obra percebida, já feita, nem a obra a ser feita; é a obra enquanto está se fazendo [PASSERON, 1989, p. 15]. O conceito de poiética na sua origem está voltado especificamente ao campo da criação artística, no entanto Passeron entende que em toda ação criativa está de alguma forma implícito o princípio deste conceito. Nesta perspectiva foi possível pensar a ação criativa do aluno como poiética – por esta razão se trouxe esse conceito para a sala de aula. Não se pretende com este uso afirmar ou sugerir que a produção da criança seja obra de arte, mas indicar a aproximação, ainda que restrita, do princípio de criação do artista.

Em sala-de-aula, a criação poiética do aluno é mediada pelo professor; depende, em primeiro lugar, do estímulo que o educador faz surtir no aluno. Esse, bem estimulado e comprometido, é capaz de ser influenciado pela sua produção estética quando percebe que esta necessita de um pensamento que implique em escolher aquilo que faz e o de assumir a responsabilidade pelo resultado de seus atos. O professor pode estimular seu educando através de leitura de imagens, exercícios de percepção, dados concretos sobre determinada época histórica e contextualização. É preciso, além desses estímulos, adquirir o domínio das linguagens, dos procedimentos, materiais e suportes, pois, sem o conhecimento prévio do material o aluno encontrará dificuldades para exercer o ato de criação.

A atividade em sala-de-aula sob a supervisão do professor é importantíssima, pois, quanto mais o aluno pratica, mais adquire experiência, aptidão e proeza em seu processo artístico. Através da pesquisa seguida do exercício prático, o aluno está exercendo uma atividade intelectual intensa, pois faz uma ligação entre esses dois atos os quais constituem a poiética.

Na diferente poiética de cada aluno é possível perceber seus aspectos identitários, pois há diversos motivos que o fizeram escolher (particularmente na colagem), aquela figura e não outra, e seu modo de recortar, colar e forma de utilizar o novo contexto (suporte para a colagem).

Desde o primeiro momento em que o aluno contempla o modelo, está estimulando sua subjetividade pessoal, que o incita a trabalhar. Mesmo a partir de um projeto pré-estabelecido e mediado pelo professor, o aluno passa por um processo de formação, no qual ele forma o significado.

É preciso estimular o educando à ação de experimentação de perceber que é possível errar, testando as várias possibilidades, selecionando-as de tal maneira que seu procedimento poiético influencie na sua capacidade de sintetizar e pensar criativamente.

Apropriação no ato de recortar e colar

O termo “apropriação” surgiu como indicativo de mais uma modalidade artística no fim dos anos 70, porém, remete-nos desde o surgimento da fotografia. A técnica da colagem sempre se valeu desse apossamento de bens comuns em suas primeiras incursões, presentes nas primeiras fotomontagens. Segundo Chiarelli [2002, p. 2]:

Apropriar-se não significa, em princípio, apropriar-se de apenas um ou dois objetos ou imagens de uma mesma natureza, ou com uma ou várias características comuns. Apropriar-se é matar simbolicamente o objeto ou a imagem; é retirá-los do fluxo da vida – aquele contínuo devir, que vai da concepção/produção até a destruição/morte –, colocando-os lado a lado a outros objetos, com intuitos os mais diversos”.

É um empréstimo que o artista faz para um novo contexto e nova organização, podendo eventualmente tomar outro sentido. As estratégias de apropriação nas Artes Visuais tendem a problematizar os conceitos de originalidade e de valorização do gesto criador do artista, subvertendo conceitos românticos de originalidade e autoria [CHIARELLI, 2002].

Esse procedimento tomou força total ao incluir-se em colagens cubistas e construções de Pablo Picasso (1881-1973) e Georges Braque (1882-1963), realizadas a partir de 1912. Foi no Cubismo Sintético que elementos heterogêneos – recortes de jornais, pedaços de madeira, cartas de baralho, letras, entre outros – são agregados à superfície das telas; as apropriações, na base das colagens, representam um ponto de desvio na arte do século XX, pois libertam o artista da “imposição” da superfície. Picasso vai encontrar no novo recurso um instrumento de experimentação inigualável, que tem o seu início com a obra “Copo e garrafa de Suze”. A partir desse momento, a técnica é largamente empregada em diferentes escolas e movimentos artísticos, com sentidos muito variados.

O artista, fazendo uso da apropriação ou não, faz o espectador perceber que “[...] a arte pode manifestar-se das mais variadas maneiras, quando passa a ser considerada um fato de ampliação de nossa percepção do próprio cotidiano” [CHIARELLI, 2002, p. 31].

O artista colagista automaticamente apropria-se de imagens ao inseri-las em um novo contexto (criando novas composições) que antes não seria possível, não fosse pelo seu deslocamento (de lugar e sentido). Ao apropriar-se de formas, conceitos, figuras e imagens, o artista demonstra sua percepção aguçada e sensibilidade de conseguir criar certos contextos, além de ao mesmo tempo estar demonstrando sua identidade em sua produção, por partir de escolhas pessoais ao criar.

Uma abordagem histórica da colagem na História das Artes Visuais

A colagem é uma técnica na qual toda representação plástica é conseguida pela união e/ou superposição de distintos materiais, colados a um suporte. Sua origem remonta-se à época da invenção do papel, na China do século II depois de Cristo. As folhas permitiam os recortes e, logo, a ligação entre eles, transformando esse conjunto em um instrumento de criação. As colagens mais antigas que se conservam são manuscritos japoneses do século XII, nos quais cada uma de suas páginas está constituída por faixas de papéis de cores justapostas, em cujas superfícies se escreviam os textos; o leitor, assim, convertia-se em espectador.

Na história das Artes Visuais, a colagem é considerada como linguagem artística e/ou expressão visual a partir do Cubismo, implementada por Picasso. Segundo alguns autores, foi Braque quem introduziu a colagem à obra de arte.

O movimento cubista surgiu como um dos principais pontos de mutação da arte do século XX, e liberou a arte ao estabelecer, nas palavras do pintor cubista Fernand Léger, que “a arte consiste em inventar, e não em copiar”. Seu precursor foi Cézanne, que se tornou o pai da "arte moderna", ao sacrificar a correção convencional da perspectiva linear e aérea em busca de um arranjo ordenado na tela, que os mestres clássicos haviam conhecido. Cézanne usava formas geométricas quando pintava e afirmava ver na natureza "o quadrado, a esfera e o cone". Seus desenhos rompiam com a apresentação tradicional de um objeto calcada na perspectiva. Mostravam a figura em mais de uma face, distorcendo-as sutilmente.

Foi no Cubismo Sintético que a colagem foi vista como novo meio de linguagem artística e/ou implementação da criação artística. Os primeiros artistas a utilizarem essa técnica foram Pablo Picasso e Georges Braque, por volta de 1912. Braque colava pedaços de papel retangulares em uma folha de papelão e ali colocava esboços de pintura. Depois de algum tempo, vários deles começaram a misturar imagens impressas de todo o tipo, desde rótulos até gravuras. Na fase sintética pretendia-se dar uma imagem sintética dos objetos, das suas formas essenciais e da sua matéria. De 1912 a 1914, o cubismo sintético ou de colagem – “papier collé” - constrói quadros com jornais, tecidos e objetos, além de tinta.

Já o movimento dadaísta, a partir de 1916, é caracterizado pela oposição por qualquer tipo de equilíbrio, pela combinação de pessimismo irônico e ingenuidade radical, pelo ceticismo absoluto e improvisação. Enfatizou o ilógico e o absurdo. Entretanto, apesar da aparente falta de sentido, o movimento protestava contra a loucura da guerra. Assim, sua principal estratégia era mesmo denunciar e escandalizar. Procurava chocar um público mais ligado a valores tradicionais e libertar a imaginação via destruição das noções artísticas convencionais. Acredita-se, ainda, que seu pessimismo venha de uma reação de desilusão causada pela Primeira Guerra Mundial.

No Dadaísmo, destacou-se uma importante artista colagista dadaísta: Hannah Höch. A serviço de uma nova concepção do corpo da mulher e dos valores de gêneros diferentes em seu país, utilizava humor e ironia em suas colagens. Mesmo fascinada pelos avanços que as mulheres experimentaram na sua época durante os anos os quais surgiram os primeiros movimentos feministas e as primeiras organizações homossexuais, Hannah criticou a imagem cosmética e frívola da nova mulher.

Depois do Dadaísmo, o outro movimento que teve artistas colagistas foi a Pop Art. A Pop Art é um movimento que mistura imagens populares de propaganda e da grande massa capitalista, como caixas de sabão em pó com outras imagens, e figuras de artistas usando pintura, serigrafia e seriação. Teve suas primeiras manifestações em 1956, quando Richard Hamilton mostrou na exposição This is tomorrow sua colagem “O que exatamente torna os lares de hoje tão diferentes, tão atraentes?”. Esse pôster formado por imagens do consumismo ajudou a estabelecer temas dominantes para o início dessa nova estética. O pôster de Hamilton demonstra de modo claro uma oscilação entre design, propaganda e belas artes, o que estaria presente de forma constante na pop art, definindo o que chamamos de hibridação, onde a barreira entre design, artes, etc., começa a ser quebrada.

No Brasil, a Pop Art chega à década de 60. A retomada da figura e a multiplicação dos meios expressivos e suportes são as características comuns à essa manifestação, assim como seu aspecto urbano, onde a natureza consumista da sociedade é captada e expressada, apropriando-se de linguagens dos meios de comunicação de massa. Os artistas que se encaixam nesse aspectos são: Cláudio Tozzi, Glauco Rodrigues, Wesley Duke Lee, Carlos Vergara, Antônio Dias, Rubens Gerchman, entre outros. A figuração brasileira desse período é quase sempre crítica; as cópias fotográficas, as fachadas, automóveis, são colocados em tamanho natural ou monumentalizados, trabalhados em cores vivas e brilhantes, próprias da tinta acrílica utilizada, compostos em temas engajados politicamente.

Rubens Gerchman, além de gravuras, esculturas, pinturas e desenhos, criou algumas colagens em sua produção na época da Pop Art brasileira. Através da obra “O sonho do índio”, representa a raiz do povo brasileiro e a presença de diferentes etnias, ao mesmo tempo em que faz uma crítica ávida à verdadeira identidade que o povo brasileiro desvirtuou, deixando para trás e não valorizando os indígenas, extinguindo-os de maneira que se tornaram minoria.

Por que ensinar arte na educação?

A arte-educação pós-moderna faz desaparecer a linha entre formas de arte eruditas e não-eruditas, enfatizando a habilidade de se interpretar a obra de arte sob o aspecto do seu contexto social e cultural como principal resultado da instrução, além da pluralidade de estilos e leituras interpretativas. O propósito da arte-educação no contexto pós-moderno é então “contribuir para o entendimento dos panoramas social e cultural habitados pelo indivíduo” [EFLAND, 2005, p. 183].

Uma das funções da escola é preservar o patrimônio cultural, e a arte faz parte dele. Através do aprendizado das artes, conhecemos e interpretamos o mundo de uma forma diferente. 

Segundo Almeida (2001, p. 14), através do ensino artístico nas escolas (quando apropriadamente lecionado) “as crianças desenvolvem auto-estima e autonomia, [...] empatia, capacidade de simbolizar, analisar, avaliar e fazer julgamentos e um pensamento mais flexível”, desenvolvendo o senso estético e também as habilidades artísticas. Os alunos que desenvolvem a sensibilidade tornam-se capazes de expressar melhor seus sentimentos e idéias, passando a compreender as relações em partes e o todo. Aprendem de uma forma melhor as modificações do mundo físico e cultural, experimentando sentimentos de afetuosidade e ampliando o pensamento reflexivo. O reconhecimento das artes como uma forma de questionamento crítico-cultural, pode levar à tomada de decisões morais.

O ensino das artes é impulsionador de mudanças ao mesmo tempo em que resguarda e media conhecimentos. Para que o passado tenha significado para os alunos, é preciso romper com concepções elitistas, que se apóiam numa visão masculina, branca e européia. É necessário inserir uma reflexão crítica, questionando toda forma de pensamento único. As ações artísticas não são inocentes e objetivas, e sim questionadoras da realidade, nas quais veiculam diferentes visões e percepção de mundo. Os alunos precisam entender esse processo para que o conhecimento faça sentido.

O objetivo do ensino artístico extrapola o campo específico das artes. Deve refletir sobre as questões políticas, sociais e culturais, discutindo as formas de inclusão social e diversidade cultural contribuindo e participando na construção de identidades dos alunos.

Habilidades artísticas também podem promover o desenvolvimento afetivo e construção de valores humanos. Por exemplo, oferecer um desenho a alguém – dedicar tempo e esforço à execução de um presente é uma forma de ajudar as crianças e jovens a construir valores.

Em seus trabalhos artísticos, a criança e o jovem manifestam sua experiência subjetiva e o que está ativo em sua mente, fornecendo registros daquilo que é significativo para eles – externalizam seus conflitos, emoções, entre tantos outros sentimentos de uma maneira particular –, porém a variação do potencial criador da criança e do jovem dependerá das oportunidades que terão em expressá-lo e do estímulo que o contexto lhes oferece.

Na socialização das diversidades culturais, familiarizamos os alunos com a produção artística a qual não se tem acesso pela mídia, ampliando o âmbito e a qualidade das experiências estéticas dos alunos, ajudando-os a compreender e respeitar as diferenças culturais – “Não podemos reproduzir na escola o que os meios de comunicação impõem, uma vez que o que vale neles é o critério de mercado e não a qualidade do produto” [ALMEIDA, 2001, p.16]. Isto deve ser feito através do contato dos alunos com as formas de expressão artística populares – Hip Hop, folclore – às mais eruditas; das ‘primitivas’ – formas de representação  rupestre, danças e músicas populares – às formas de expressão artística contemporânea, não se restringindo à apreciação ocidental.

A educação em arte contribui para que os alunos se tornem ética e intelectualmente livres para pensar e expressar-se, pois ajuda no desenvolvimento da autonomia, levando-os a agir de forma independente.  Nenhuma proposta em si é adequada a toda situação de ensino e aprendizagem, ela necessita ser apropriada pelo professor, para que faça sentido para os alunos (e também para ele). O professor precisa compreender a proposta em seus objetivos, conteúdo e processos de desenvolvimento e avaliação. 

Colagem como linguagem artística dos alunos

A colagem, como linguagem artística, remete ao intelectual e ao físico.  O intelectual processa o pensar, o que faz com que certas escolhas estejam ligadas ao próprio gosto de quem está fazendo a colagem e à identificação que a pessoa tem por ter escolhido particularmente aquele “pedaço de papel” e não outro, assim como pensar o novo contexto no qual a imagem surgirá.

O físico é o próprio ato de pegar a tesoura e recortar, para depois colar e constituir em um contexto totalmente diferente do visto originalmente no ato intelectual. Portanto, os dois procedimentos estão interligados entre si, demonstrando que a colagem é um ato profundamente ligado à identidade; uma mesma figura pode ter diferentes significados para uma pessoa à outra, além da forma que cada um possui de montar certa composição e pensar as diversas possibilidades ou afinidades.

O Estágio Curricular Supervisionado (E.C.S.) foi efetuado nas turmas da 7ª série/Fundamental (matutino) e 1º ano do Ensino Médio (noturno), da Escola Estadual Básica Dom Pio de Freitas. Antes do período de regência, foram efetuadas horas de participação e foi observado o campo de estágio, além de várias aulas no Ensino Fundamental e Médio.

Foi visível que o ensino da arte com estas turmas tem um enfoque e limitação a apenas duas linguagens artísticas: a releitura e o desenho. A primeira, muitas vezes equivocada, aparece como cópia no Ensino Médio e parte do Fundamental (5ª a 8ª série). A segunda é proposta como uma técnica em folha de papel sulfite onde apenas o lápis grafite e os lápis de cores são permitidos na composição do trabalho artístico (1ª a 4ª série); com isso cria-se o questionamento: através da linguagem artística colagem, é possível construir com os alunos conhecimentos sobre as mais variadas técnicas/opções e perceber sua importância na expressão identitária, como auxílio na ampliação da visão de mundo?

A colagem é uma linguagem utilizada na escola de uma forma pobre, pois, normalmente seu uso é para um único fim, o ato em si, sem a contextualização precisa e sem o procedimento intelectual necessário. Propondo a colagem como ferramenta da arte-educação, ela pode ser dirigida ou livre. Dirigida se o professor limitar o aluno ao que ele deve procurar e colar; ex: procurar formas triangulares nas revistas – que foi uma das propostas pedagógicas utilizadas por uma professora observada no estágio de Observação. A outra proposta, livre, é aquela proposta na qual o aluno é livre para escolher as figuras que mais lhe agradam, diretamente ligada ao seu gosto, experiência de vida, identidade, intelecto e visão de mundo, e a partir delas fazer uma composição, ou talvez até misturar diferentes técnicas como o desenho, pintura, etc.

Ora, se conhecer e fazer arte é ampliar o sensível, como mudar esse quadro escolar de artes que se preocupa apenas com o fazer artístico, sem a reflexão para a evolução do indivíduo na sociedade preocupante de hoje que, preferindo não arcar com as conseqüências de impor a proposta pronta e feita para o aluno, não o faz pensar?

Baseada nessa problemática, a metodologia que foi aplicada no E.C.S. constou do que se segue: a regência no Ensino Fundamental ocorreu com a turma 7ª 01 do período Matutino, perfazendo 12h/a, sob supervisão da professora de Artes. A freqüência de aulas abrangeu 2h/a por semana. No Ensino Médio a regência foi realizada com a turma 1º 04 do período noturno, também com 12h/a, sob supervisão da professora de Artes, com freqüência de 2h semanais.

Os assuntos contextualizados com os alunos requeriu leitura de imagens, vivência prática e explanação teórica. Em primeiro lugar, a identidade, cultura e diferenças culturais foram abordados, através de atividades práticas como o auto-retrato, para a compreensão da existência e importância do eu e do outro. Logo após, uma abordagem histórica foi necessária para que os alunos pudessem compreender o papel importante da colagem como linguagem artística revolucionária na História das Artes, como surgida no Cubismo Sintético e tendo seu auge com Hannah Höch, no Dadaísmo. Atividades práticas como representação da mulher atual utilizando a colagem foram feitas, além de desenhos cubistas junto com colagens, para compreenderem a importância que esse tem nas Artes Visuais, como precursor de mudanças fundamentais. A Pop Art e Rubens Gerchman foram abordados, e então uma atividade envolvendo colagens – história em quadrinhos – foi produzida pelos alunos, através do conhecimento e leitura de imagens de obras de Roy Lichtenstein. Finalizando o assunto colagem, uma composição em grupo foi feita pelos alunos, com tema livre e utilizando revistas atuais e reproduções de obras de arte, trazendo resultados e participações muito interessantes.  

Conclusão

Ao deparar-se com o projeto “A colagem como recurso poiético no ensino da arte”, os alunos ampliaram, de maneira significativa, seus procedimentos intelectuais e de reflexão, além de que – através do ato físico – exerceram sua criatividade e capacidade de elaboração, ao criar um novo contexto para diferentes figuras que, na maioria das vezes, não possuem nenhuma relação entre si, mas que juntos trazem resultados interessantes e novas relações formais e intelectuais.  Foi possível que chegasse ao alcance dos alunos diferentes técnicas artísticas, através da contextualização histórica da colagem e leitura de imagens de obras-de-arte que foram utilizadas com essa técnica. Com as experiências artísticas que tiveram com a colagem, aprofundaram, através de atividades didáticas, a leitura e a representação de mundo e sua identidade pessoal. O projeto auxiliou na descoberta da importância da arte, por não ser um simples ato de criar, e sim possuir uma contextualização com objetivos.

Teoria e prática foram abordados ao longo do Estágio, criando um equilíbrio, e surpreendendo muitos alunos que pensavam que arte “é só desenho”.  Os assuntos abordados teoricamente interessaram tanto aos alunos do Ensino Fundamental quanto os do Médio, mostrando que é preciso aprofundar-se quando algum assunto histórico é proposto, além de que, quando o sujeito que transmite esse assunto possui uma paixão por ele, acaba por transmiti-lo por seu conhecimento e sua contextualização com o “mundo” dos alunos.

A maioria dos alunos demonstrou interesse pelas atividades propostas, por serem diferentes (mesmo sendo com a mesma temática) e possuírem uma contextualização e, também, por ter sido demonstrado a eles que a arte auxilia na formação intelectual, na capacidade de criação e na elaboração do pensamento.

Muita interação entre aluno-estagiário ocorreu, facilitando o trabalho proposto em compreender a importância da colagem como recurso artístico e histórico (e até mesmo de ruptura na história das Artes Visuais) com exatidão pelos alunos, dando uma resposta positiva aos momentos de motivação. Essa troca de conhecimentos entre o aluno e a estagiária ao longo do período do estágio foi gratificante, pois interagindo e adquirindo conhecimento com os outros que evoluímos como indivíduo na sociedade tão preocupante de hoje, que impõe certos valores pessimistas, principalmente à comunidade abordada. A arte contribui para essa reflexão, pois amplia o sensível do ser humano, ajudando de forma especial à elaboração do pensamento crítico.

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