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AS IMAGENS DIGITAIS E O SUJEITO QUE INTERAGE
Autoras:
Rogéria Eler Silva[1] - rogeller@gmail.com e Alice Fátima Martins[2] - profalice2fm@gmail.com

Resumo: A discussão aqui proposta dirige-se a imagens técnicas, analógicas e digitais, geradas, manipuladas e deslocadas por jovens inseridos num contexto virtual que estabelece novas articulações no que conhecemos como construção subjetiva em relação às vivências da cultura contemporânea.

Palavras-chave: Internet, Cultura Visual, Imagens digitais.

Abstract: The questions of research, here, points to the technical images, analogical and digital ones, recorded, manipulated and moved by peer, young people, in a virtual context that establishes new kinds of meanings in that we know as subjective construction in relation to contemporary culture experiences.

Key-words: Internet, Visual Vulture, Digital images.

Neste trabalho, são apresentadas algumas reflexões que resultam de pesquisa em andamento, com foco nas vivências culturais imagéticas propiciadas pelas interações de jovens estudantes no ambiente da Internet, e nas relações que a escola tenha estabelecido com essa dimensão da cultura contemporânea. O objetivo dessa pesquisa é registrar e discutir as vivências que transitam entre o ambiente escolar e os ambientes virtuais, configurando uma prática recorrente de um comportamento crescente na contemporaneidade. Para este artigo, foi feito um pequeno recorte das discussões em curso, com ênfase nos fluxos de imagens digitais nos ambientes virtuais, como um dos traços marcantes da cultura contemporânea. Ressalta-se o fato de que os jovens são os principais agentes desses fluxos imagéticos, e que as instituições escolares têm reservado espaços muito restritos para o diálogo com seus estudantes esse aspecto de seus cotidianos.

A Internet configura, para o contexto escolar, possibilidades curriculares para conhecimento e educação, sendo chamada, muitas vezes, de arquivo universal, no qual o navegador tem acesso a todo tipo de informação, desde que ali disponibilizada. Esse suporte vem a ser um (não)lugar amplo, cujas possibilidades fazem crer serem infinitas.

Uma parte significativa da população dedica parte de seu cotidiano a atividades que envolvem blogs, fotologs, sites de imagens e de relacionamentos, dentre outras opções disponíveis. Essas atividades incluem, dentre tantas, edição de imagens fixas e em movimento registradas com aparelhos celulares e câmeras fotográficas digitais, além daquelas capturadas dos meios de comunicação, no exercício da interatividade. Novos adeptos, de diversas idades, rendem-se às novidades. Mas são, sobretudo, as crianças e os jovens que têm investido parcelas significativas de seu tempo nas práticas desse processo. Dada sua faixa etária, tratam-se, em sua maioria, de alunos do Ensino Fundamental e Ensino Médio, que, cada vez mais, fora do ambiente escolar, ocupam-se com novidades que chegam a todo instante, em alta velocidade.

Já são recorrentes os depoimentos de pais e professores que afirmam que, com o computador, as escolas passaram a possuir todos os livros. O computador, portanto é divulgado como um milagre para a educação, um milagre à espera, tão somente, de um clique no mouse...

Mas encontrar informações e produzir conhecimento a partir da rede mundial de computadores não é tarefa fácil: requer habilidades, discernimento, e capacidade seletiva, pois boa parte de seus conteúdos são configurados com propósitos comerciais, de entretenimento, ou com finalidades nem sempre explicitadas. Além da falta de rigor na natureza da maior parte das informações que veiculam.

Há um descompasso entre os procedimentos escolares e os trânsitos dos estudantes no ambiente da Internet, com o qual os próprios professores e demais profissionais da educação ainda não se sentem à vontade, faltando-lhes a necessária familiaridade com os processos implicados na chamada Informatização das Escolas.  A esse respeito, basta notar que, fora do ambiente escolar, em casa ou em Lan Houses[3], os alunos acessam, com muito mais freqüência que seus professores, a rede mundial de computadores, onde, além de buscar entretenimento, realizam os trabalhos escolares.

As instituições escolares estão pouco inteiradas, também, sobre a freqüência, o tempo e o nível de envolvimento com que seus jovens alunos têm se dedicado à navegação na Internet, e como distribuem esse tempo, a que tipos de atividades (sites de relacionamentos, tarefas escolares, etc.). Em contrapartida, é notório o aumento do número de Lan Houses, em especial nos espaços que circundam as escolas, cujo principal público alvo são os estudantes da educação básica, e que não só investem no horário de término das aulas, mas, e, sobretudo, concorrem mesmo com os horários regulares do ensino escolar.

Entre os alunos, este fenômeno tem transformado a natureza de boa parte das aprendizagens, transferindo muito dos processos da sala de aula, incluídos aí muitos referenciais de processos criativos, para o ambiente virtual. Ao mesmo tempo, muitos são os relatos que dão conta do desinteresse por parte dos estudantes em fazer o uso da escrita em sala de aula ao sentir falta de mouse ou de teclas de atalho para expressarem-se.

Nos ambientes virtuais, os alunos mostram-se mais à vontade do que seus professores. Navegam pela internet, transitam por atalhos e links num total domínio e familiaridade que se atualizam a cada dia, observando modos de relacionamentos, normatividades e demandas desse "mundo virtual" que concorrem e subtraem o interesse e a motivação sobre o que aconteça no ambiente das salas de aula, onde os professores têm obtido pouco sucesso nos esforços para estabelecer espaços efetivos de diálogos. A esse respeito, ressalta Lemos:

A juventude acostumada a interagir na Rede não quer mais ser platéia do conhecimento. A resposta do educador será a politização dos meios de comunicação e interação. No caminho desta politização, ele terá de se auto-educar no sentido de uma relação mais interativa com o conhecimento, a cultura e o educando [LEMOS, 1999].

Não faltam defensores entusiasmados para a idéia de que a Internet educa tão somente pelo fato de ser um extenso campo de pesquisa; outros mais advertentes alertam que ela não educa, configurando sim, um veículo privilegiado para propagar informações das mais diversas naturezas, inclusive, talvez principalmente, o lixo cultural de sempre, em forma de todo o tipo de quinquilharias e comportamentos massificados [LEMOS,1999].

Diante de tantas inovações na era da “Placa Mãe”, a escola se vê circundada pela Deusa Mãe, a Internet. Dentre todas as informações que circulam em fluxos e contra-fluxos nessa rede mundial, o trânsito de imagens ganha destaque, integrando, também, o cotidiano de jovens e adolescentes, alunos das instituições escolares da Educação Básica. Neste artigo, ganha foco a indagação sobre essas imagens. Que imagens são essas? O que dizem essas imagens? Quem fala das imagens?

Podemos considerar que a Internet pode ser pensada como campo potencial de construção de aprendizagens na produção e compreensão de imagens, como território de construções que articulam técnica, informações objetivas e referenciais subjetivos, a partir de determinados contextos sócio-culturais? Que relações a escola mantém com esse fluxo emergente?

Uma das marcas do nosso tempo está na aceleração da produção e circulação de imagens visuais de maneira extraordinária. A popularidade das imagens analógicas e digitais, juntamente com o advento das tecnologias disponíveis para a produção e edição de imagens virtuais, sobretudo as distribuídas através da Internet, tem aberto um campo de investigação e interesse sobre as imagens em relação aos meios de produção da visão [HERNANDEZ, 2005].

A inter-visualidade global que se vai tramando, na atualidade, configura um fenômeno que, aliado aos novos meios de produção e representação de imagens, supõe um diferencial, por sua visualidade, em relação às imagens do cinema ou do simulacro da cultura, observadas a partir dos anos 80.

Essas imagens nos colocam frente a uma realidade imaterial, imponderável, com a qual nos relacionamos, muitas vezes, sem nos darmos conta de que se trata de um ambiente codificado matematicamente. As imagens numéricas configuram novas realidades. Nesses termos, cabe a questão sobre como a visão configura-se dentro desses novos referenciais. Como os sujeitos interatores estabelecem as relações entre suas subjetividades, suas idiossincrasias, e os universos imagéticos configurados numericamente, a gerar novas referências de mundo?

A reflexão sobre tais processos decorre da necessidade de compreender esse, dentre os fenômenos emergentes na cultura contemporânea, com ênfase nas subjetividades e nos olhares alternativos que estão sobre os comportamentos humanos neste terceiro milênio. Esse esforço justifica-se, em particular, se tivermos em vista a necessidade de se estabelecer canais de comunicação efetivos entre professores e estudantes, nos ambientes de educação formal e não-formal, buscando-se espaços efetivamente significativos de construção de aprendizagens, em particular no que tange às interpretações imagéticas, à expressão visual, à estética vigente nesses ambientes que orienta esses fluxos de imagens. Há muito a se aprender, nas escolas de Educação Básica, sobre esses trânsitos percorridos pelas crianças e adolescentes que freqüentem suas salas de aula. Há mais, ainda, no tocante às concepções de arte, estética, imagem, etc.

Vale lembrar que a identidade do indivíduo contemporâneo está, marcadamente, no devir do processo de globalização, fenômeno a partir do qual se observa o deslocamento de identidades culturais como resultado das dinâmicas, de escala global, que enfraquecem fronteiras nacionais [HALL, 2005], físicas ou simbólicas, colocando em relação comunidades e organizações em novas e diferentes contigüidades, tornando o mundo mais interconectado.

A Internet, rede mundial que conecta sujeitos e instituições, também comprime o espaço-tempo, acelerando os processos globais. Trata-se, essa rede, de um suporte que tem se tornado acessível a uma porcentagem cada vez mais elevada de interatores, oferecendo acesso rápido e facilitado.

Miríades de narrativas pessoais têm sido lançadas nessa esfera gigantesca, por meio de textos, fotos, vídeos, e outros recursos tão freqüentes no contexto virtual,  a partir de espaços como e-mails, blogs, fotologs, orkut, youtube,  etc. Tais narrativas, assim como no cinema, articulam discursos, revelam pontos de vista, propõem sensações, ilusões, impressões da realidade, com um diferencial que configura o espetáculo: a projeção da própria imagem em um veículo de alcance mundial. Neste contexto, podemos sinalizar as relações indivíduo-objeto a partir das narrativas visuais proporcionadas no contexto virtual, permitindo que o interlocutor seja absorvido pelo simulacro, com sua imagem digital.

O conteúdo das imagens é parte dinâmica e integrante da cultura, cujas visualidades articulam referências da história geral e local, tendo em vista a heterogeneidade numa abordagem educacional policêntrica que tenham em conta as mudanças na arte e na cultura.

O Século XXI tem sido apontado como o século digital, quando a excitação das novas gerações na expectativa de novidades tecnológicas decorre, exatamente, das possibilidades da tecnologia digital em suas múltiplas possibilidades. Os fluxos contínuos de incontáveis mensagens imagéticas encontram na Rede Mundial de Computadores o principal suporte de veiculação, mas também de edição. Aparentemente, nesse ambiente essencialmente planetário e global, centros e periferias entrecruzam-se.

As imagens articuladas nesse contexto têm forçado o redimensionamento de certos conceitos e campos de conhecimento e expressão. Para Flusser [1985], por exemplo, nesse contexto, o próprio termo arte se torna pálido demais para captar as facetas do programador que se diferencia dos moldes estéticos tradicionais pretendendo referenciar estas construções de modelos de vivência concreta.  As imagens que circulam no ciberespaço, quaisquer que sejam sua natureza e alcunha, têm caracterizado as gerações do século XXI a partir do fenômeno social da cibercultura, que se estende além dos meros exercícios de expressão, envolvendo as complexas relações econômicas globais, conflitos bélicos, e novas demarcações territoriais.

Com tudo isso, o grande desafio que se coloca aos educadores é superar o descompasso entre a cultura escolar e as dinâmicas da cibercultura. Em particular, no tocante ao ensino de artes visuais, é preciso rever em que medida as práticas educativas têm aberto espaço a essas visualidades para, a partir delas, propiciar a construção de aprendizagens efetivamente significativas, que motivem estudantes e professores a singrarem esses mares digitais, de modo mais crítico, criativo.

Referências Bibliográficas

ALVES-MAZZOTTI, A. J. ; GEWANSZDNAJDER, F. O método nas ciências naturais e sociais: pesquisas quantitativas e qualitativas. 6. ed. São Paulo: Pioneira, 2004.

HALL, S. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: PP&A, 2005.

HERNANDEZ, F. De qué hablamos cuando hablamos de cultura visual? Educação & Realidade 30(2): 9-34, jul/dez 2005.

LEMOS, M.A.B.; WINCK, J. A Internet educa? Acesso em: 08/06/2007. Disponível em: http://click.adbrite.com/mb/click.php  

FABRIS, A. KERN, M.L.B. org. Imagem e conhecimento. FLUSSER, V. Sintetizar imagens. São Paulo. Editora USP. P. 320.

Notas:

[1] Mestranda do Programa de Pós Graduação, Mestrado em Cultura Visual, pela Faculdade de Artes Visuais, UFG. É Orientadora de Tutores de Pólos na Educação à Distância no curso de Licenciatura em Artes Visuais (UFG/FAV/CIAR) e professora da Secretaria Estadual de Educação.

[2] Doutora em Sociologia (UnB), Mestre em Educação (UnB), Arte Educadora, Professora no Curso de Licenciatura em Artes Visuais, Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Cultura Visual (FAV/UFG) no período de 2005 a 2008.

[3]Lan House, conforme a Enciclopédia, é um estabelecimento comercial onde, à semelhança de um cyber café, as pessoas podem pagar para utilizar um computador com acesso à Internet e a uma rede local, com o principal fim de jogar em rede. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Especial. Acesso em 25.06.07.

 

Revista Digital Art& - ISSN 1806-2962 - Ano VI - Número 10 - Novembro de 2008 - Webmaster - Todos os Direitos Reservados

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