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        Editorial ::  Olá gente... Mais um número 
        da nossa Revista Digital Art& 
        entra no ar, nesta primavera de 2007. Nossa oitava edição trás muitas 
        coisas interessantes e algumas novidades. A primeira 
        das novidades é a criação da editoria “Cultura 
        Popular”, sob coordenação da Profa. Dra. Isabela Frade, da UERJ, vem 
        complementar nosso trabalho, ampliando a área de pesquisa e interesse 
        da revista, sempre na perspectiva de ser uma ferramenta de divulgação 
        de trabalhos significativos na nossa área: Ensino de Arte. Neste editorial, 
        deste número 8, quero mostrar também um evento onde estive, como convidada 
        da Profa. Me. Heloisa Helena da F. C. Leão, conhecendo o trabalho dos 
        alunos do 5º. Semestre de Artes Plásticas, da Faculdade Paulista de Arte, 
        em SP, Capital: A NOITE DA PERFORMANCE. 
        Em 25 de junho de 2007 os alunos da professora Heloísa realizaram uma 
        mostra de trabalhos bastante interessante. Veja as fotos 
        e confira, no YouTube, 
        alguns dos trabalhos. Uma outra 
        visita que fiz, também merece ser registrada. Fui conhecer a loja/espaço 
        cultural Vosso Reino Costumes, em Araraquara/SP. 
        Orquestrado pela estilista e artista plástica Lúcia Furtado, o Vosso Reino 
        Costumes é uma espaço de moda, arte e cultura onde a estilista desenvolve 
        suas coleções exclusivas com forte influência da cultura popular.  Roupas customizadas, 
        bijouterias e acessórios compõem a produção do atelier, além de figurinos 
        teatrais, a mais nova experiência de Lúcia, que comanda as atividades 
        e que, com a experiência de anos na organização de produção de eventos, 
        trás uma abordagem interessante ao espaço. Instalado 
        numa deliciosa casa de vila, no centro de Araraquara, interior de São 
        Paulo, a Vosso Reino também funciona como 
        galeria e espaço cultural, promovendo eventos conhecidos entre o povo 
        pensante da cidade e região. Se cada cidade 
        tivesse ao menos um espaço como a Vosso Reino, estaríamos muitíssimo bem-servidos 
        em matéria de lugares da arte. A Vosso 
        Reino Costumes fica na Avenida Osório, 206, casa 31, Vila Magnani, 
        Centro. Araraquara. Confira as fotos do espaço! Por fim, 
        mas não menos importante, como homenagem especial à grande mestra, a arte-educadora 
        Laís Aderne, trago três depoimentos enviados por Ana Mae Barbosa, que 
        nos fazem lembrar e nos dão uma pequena idéia da enorme perda, para a 
        arte-educação, que foi a morte dessa educadora, em 12 de maio de 2007. Não fui aluna 
        dela, infelizmente, mas conhecia seu trabalho e sempre admirei sua competência 
        e talento profissional. Formada por Noêmia Varela, Laís Fontoura Aderne 
        era de uma imensa de uma inteligência criativa e, principalmente, generosa, 
        em seu jeito manso, mas firme, de quem sempre soube provocar mudanças 
        e (re)inventar caminhos.  Juntamos-nos 
        a estes depoimentos na nossa homenagem a esta personalidade marcante, 
        que ajudou a “inventar” a FAEB, que este ano completa 20 anos de existências, 
        no grande encontro promovido por ela no FLAAC em Brasília, sendo sua primeira 
        presidente. Nas palavras 
        dessas queridas educadoras, oferecemos para Laís Aderne, nosso respeito, 
        carinho e nossas saudades. 
 Os depoimentos 
        enviados por Ana Mae Barbosa: Querida 
        Ju, Nós, 
        as amigas de Laís, estamos nos correspondendo e aí vão alguns textos. 
        Se você achar pertinente ponha-os, ou na FAEB, ou no ARTE-EDUCAR, ou na 
        Revista. É difícil, para mim, julgar o melhor lugar. Estou ainda muito 
        bloqueada pela morte de Laís, mas é consolador compartilhar com os 
        arte-educadores nossas memórias.  Um 
        beijo, Ana 
        Mae 
        
          | A 
              quem interessar possa, aí vai uma historinha de amor: Éramos 
              três as “filhas” de Laís. Assim ela nos agrupava: Nanduca, Zaíra 
              e eu. Nanduca fez a passagem ainda muito jovem, muito bela. Às vezes 
              me esforço para lembrar como ela era. Mas me lembro que brincávamos 
              com a beleza e a feminilidade dela. Eu dizia – e éramos muito jovens 
              – que não ia mais sair com Nanduca porque ela atraía todos os olhares 
              masculinos... Sem dúvida Zaíra era a mais popular. Tinha um Gordini 
              (eu disse que éramos jovens). Zaíra, o Gordini e a buzina do minúsculo 
              carro também atraíam olhares quando passávamos empacotadas dentro 
              dele. O tempo era de uma Brasília ainda muito pequena e muito mais 
              provinciana. A buzina e os acenos a quem passava – parecia que a 
              gente conhecia a cidade inteira -, alegravam o caminho do pré-universitário 
              para a casa da Laís ou para casa da Zaíra onde nos enfurnávamos 
              quando saíamos do trabalho no Carmo, sede dos cursos profissionalizantes 
              onde Laís nos empregou, nos estruturou, nos guiou e nos amarrou 
              definitivamente à sua vida. Era o começo da década de 70 do século 
              passado... Zaíra há muitos anos é a senhora Milne. Vive na Inglaterra... 
              *(ela conta a experiência de vida com Laís) Eu 
              saí e voltei para o Brasil. A todos os endereços que tive chegaram 
              cartas, bilhetes, notinhas e visitas carinhosas de dona Lalá. Estive 
              em quase todos os lugares onde ela morou. Todos encantadores. Ela 
              tinha um jeito tão dela de organizar as coisas em 
              casa. Esses lugares ficaram, com certeza, marcados 
              na memória de quem por eles passou, de quem recebeu das mãos dela 
              um cobertor mais quentinho, o travesseiro mais macio da casa, a 
              mesa de café da manhã carinhosamente bem posta. Ah! E as comidinhas 
              da dona Lalá?... A última ceia foi o bacalhau, em 
              Olhos D’Água, no começo do ano. Foi quando também 
              nos prometemos à mesa que não demoraríamos tanto para nos encontrar 
              novamente. Nesse dia ela passou muito mal. Culpou a comida. Explicou 
              que já vinha se alimentando mal. Veio a sentir a mesma dor em 23 
              de março passado quando me telefonou pedindo que a levasse ao hospital 
              em Taguatinga onde o gastro a esperava. Eu sabia que a dor era muita. 
              Ela não era de se abater por pouco. Disse-me que já havia pedido 
              um táxi que a levaria ao meu encontro, pois não queria ir sozinha 
              para o hospital. Encontramos-nos na escadaria da igreja de Nossa 
              Senhora de Fátima e a maratona dos hospitais, que começou no final 
              da tarde de uma sexta-feira, acabou na quarta seguinte pela manhã 
              quando a tomografia revelou a mim, a ela e a Alcione o câncer no 
              fígado e talvez no pâncreas... Não era a primeira suspeita, uma 
              sub-oclusão intestinal.  Houve 
              um tempo em 
              que Laís e eu éramos mãe e filha. Os tais tempos 
              do Carmo. Quando me vi mãe, tive nela uma irmã. Assim ficamos em 
              fases de se encontrar e de se perder... Foi uma fase difícil de 
              capturá-la, sempre envolvida em algum projeto maior do que ela, 
              maior do que o mundo. Grande demais para a minha compreensão de 
              mãe tentando criar duas filhas e de profissional tentando me manter 
              num mercado de trabalho cada vez mais inóspito. Eram os anos 80/90. 
              Essa fase culminou com a primeira grande doença dela, que acabou 
              nos juntando outra vez.  Eu a estranhei. Eu não conseguia entender 
              como numa cama de convalescente, a minha cama emprestada, pudesse 
              caber tantos projetos, tantas pessoas em volta, tantos telefonemas. 
              Insistia que ela precisava respeitar aquela doença, aquela chamada 
              ao recolhimento. Disse sem qualquer remorso ou ressentimento que 
              lamentava que ela não me tivesse deixado cuidar dela. Entendi então 
              que ela cuidava dos outros e pouco se deixava cuidar.  Ultimamente 
              éramos amigas. Quando ela se despediu de mim no alvoroço de ir para 
              Belo Horizonte em busca de tratamento, o tom da voz voltara ao de 
              mãe para filha. Era ainda uma voz composta, colocada. Quando nos 
              falamos pela última vez, ela já no Rio de Janeiro, a voz era quase 
              nenhuma. E como se fechássemos o ciclo da nossa (con)vivência, de 
              volta ao começo, deu para ouvir aqui e ali um “tá bem minha filha”, 
              em resposta às recomendações de que se cuidasse. Ela nunca me obedeceu. 
              Talvez porque não gostasse da inversão de papéis. Mas respondia 
              sempre muito cordata aos meus apelos, ao longo de mais de 30 anos, 
              para que não contasse tanto com certas pessoas, que parasse com 
              a correria, que delegasse tarefas, que fizesse de Olhos D’Água, 
              Corumbá, Pirenópolis, Belém, Brasil, América Latina e do Universo 
              apenas um projeto e não uma razão de viver, um campo de batalha. 
              Que fizesse os exames, que não sumisse, que não morresse, que não 
              nos deixasse – eu filha, irmã e amiga - nesta esquisita e imensa 
              solidão.   Nira * 
              Eu sou Zaíra a filha mais velha. Conheci a Laís quando tinha 18 
              anos. Ela foi minha professora de Arte quando Arte não fazia parte 
              do curriculum. Ela minha líder revolucionaria e espiritual. Apesar 
              de discordar eu sempre ouvi o que ela tinha a propor porque eu sempre 
              acreditei que ela estava no caminho certo. E sempre foi assim. Laís 
              ia quebrando os moldes e deixando a gente passar. Foi ela quem me 
              deu meu primeiro trabalho como professora e a oportunidade de trabalhar 
              no teatro. Foi na cozinha da Laís que eu aprendi a cozinhar, a negociar, 
              a escutar. Eu aprendi sobre Arte Educação, Helena Antipoff, Jung, 
              Terapia, cores, formas, mensagens, amar a Inglaterra e escrever 
              cartas pro Piers em Inglês (a minha gramática portuguesa não era 
              das melhores, mas a inglesa era nula). Aprendi a respeito da responsabilidade 
              de trabalhar como professora e entendi que: “Tu te tornas eternamente 
              responsável por aquilo que cativas” (A.S. Exupéry). De 
              vez em quando eu sonhava com a Laís. Imediatamente entrava em contacto 
              com ela e ela ia desvendando e interpretando a mensagem do meu sonho. 
              Todos os sonhos que eu tive com a Laís tinham uma resposta que faziam 
              sentido pra ela.  Laís 
              veio fazer o mestrado na Inglaterra. Depois de dois anos de luta, 
              ela voltava para o Brasil. Combinamos que eu a levaria para o Aeroporto. 
              Viagem marcada para as 3 da tarde. Telefonei para marcar a hora 
              de buscá-la. Ela determinou que eu fosse almoçar. Eu fui, porque 
              não adiantava argumentar. Quanto cheguei à casa da Jane onde ela 
              estava hospedada tinha umas caixas abertas, livros, sapatos, roupas 
              para Olhos D’Água. Adolescentes fazendo cartões de despedida, ex-amores 
              pesando a bagagem, amigos distantes com flores e outras pessoas... 
              Ela me disse: vai fechando essas caixas que eu vou fazer um Vatapá’ 
              pro almoço. VATAPÁ? Eu quase desmaiei. Sabe de uma coisa? Ela fez 
              o Vatapá, todo mundo comeu e TAVA BOM PRA CARAMBA!  Chegamos ao 
              aeroporto 5 min antes de fechar o vôo. Todas as caixas foram despachadas 
              sem pagar extra e ela voltou pro Brasil com um sorriso.  Como 
              a Nira, eu sempre quis tomar conta da Laís. Então quando ela ficou 
              doente num Natal na casa do Pierre, ele mandou ela pra Inglaterra 
              pra se recuperar. Ela chegou mansa e eu pensei que ia poder fazer 
              sopa e abraçá-la por um longo tempo. FORGET! No fim da primeira 
              semana ela estava se sentindo melhor e foi um tal de telefonema, 
              projeto, conexão, fax, senha, cartão de crédito, viagem, visita, 
              me empresta um dinheiro eu te pago em goiaba, tira daqui bota ali, 
              telefona pra UNESCO, leia isso, entenda aquilo... Quando ela voltou 
              pro Brasil cheia de energia eu passei um tempo me recuperando. Bem, 
              tem tanta coisa pra contar... Laís abriu meu caminho, meu futuro 
              e como boa mãe/professora ela me empurrou nele. Na realidade eu 
              preferia ficar longe da Laís porque assim eu a tinha, na minha memória, 
              só pra mim. Laís nunca foi minha, ela era do povo, ela era água 
              e ninguém segura água.  Lalá 
              querida, minha tribo, eu te amo.  Inté, Zaíra Obrigada 
              Jane por ter me mandado estes tributos à nossa grande amiga. Comigo 
              era o contrário, Laís é que cuidava de mim. Na época em que atuamos 
              na Comissão de Especialistas em Arte e Design, criada graças a ela, 
              eu sempre voltava de Brasília muito bem disposta. Meu marido estranhava 
              e dizia: - Você sempre volta das viagens estropiada, menos de Brasília. 
              A resposta era o comando de Laís. Ela me hospedava, não me deixava 
              beber coca-cola nem comer coisas gordas ou extravagantes, que eu 
              adoro. Mantinha para mim a mesma dieta naturalista que ela e Otavio 
              (seu último marido, um cara maravilhoso) seguiam, me fazia dormir 
              cedo, trabalhar muito, mas também me levava às massagistas e espiritualistas. 
              Aí residia nossa maior diferença. Eu ia, mas não acreditava. Nossas  
              brigas foram motivadas pelo misticismo dela e pelo que ela chamava 
              de meu intelectualismo. Mas, 
              quando minha filha ficou tetraplégica e sem fala eu corri para ela 
              que se socorreu de seus amigos espiritualistas que não nos enganaram 
              , não nos deram nenhuma esperança. Mas, ela não desistia e nos mandava 
              a água milagrosa que bebia, o travesseiro de carvão e outras coisas 
              naturalistas que acreditava melhorariam a vida de Ana Amália. Unia-nos 
              uma mãe intelectual em comum, Noêmia Varela, a qual dividíamos com 
              carinho e sem nenhum ciúme, como a própria D. Noêmia reconhecia. 
               Quando 
              D. Noêmia foi injustiçada por uma rica senhora presidente da 
              Escolinha, Laís e eu corremos em sua defesa e graças aos princípios 
              feministas que começavam a ser ouvidos no Brasil fomos felizes em 
              impregnar nossos alunos de admiração e respeito pela figura irrepreensível 
              de Noêmia Varela. Curtíamos 
              muito os filhos uma da outra. Pierre sempre foi um menino sedutor, 
              inteligente e inventivo que me encantava e Laís também curtia o 
              jeito desafiador de Ana Amália com quem conviveu na Inglaterra. Fomos 
              irmãs em ações e herança cultural.  Queria 
              escrever sobre a Inglaterra (1982), os tempos difíceis de mestrado 
              para ela e Nilza, de doutorado, para Pedrosa e Jane, de 
              estar sem família para mim, tudo temperado pela eterna alegria de 
              Zaíra que voltara a estudar. Era um grupo de brasileiros muito especial, 
              todo mundo já definido na vida, mas querendo fazer mudanças e sonhando 
              com um Brasil melhor, saído da ditadura. Participei 
              de todos os projetos de Laís exceto o primeiro e o último: 
              Olhos D’Água e o de Corumbá. No início da recuperação cultural de 
              Olhos D’Água, eu a conhecia de longe, mas ela não descansou 
              enquanto não me levou a uma feira de trocas. Que maravilha! Tornamos-nos 
              grandes amigas na Inglaterra, em 1970, no Congresso Mundial da INSEA, 
              o primeiro para mim, para ela e para umas dez brasileiras animadas 
              em torno de Léa Elliot, que nos recebeu como uma fina anfitriã. Havia 
              mais gente do Brasil, mas era a oficialidade da Arte-Educação do 
              país daquela época da ditadura.  De Corumbá participei 
              indiretamente indicando David Ecker para dialogar com ela, mas eu 
              já não tinha a mesma mobilidade de antes da doença de minha filha. Não 
              cheguei ao Rio a tempo de vê-la, nem de acompanhar o seu enterro, 
              mas pude ver a última paisagem que ela viu, aquele lindo mar de 
              Copacabana acenando com a vida eterna. Beijo, Ana 
              Mae.   Espero 
              que gostem dessa edição, como têm gostado das anteriores. Temos 
              feito nosso melhor pelo nosso sonho! Beijinho,Ju
 Ju 
              Sampaio-Ralha Editora Chefe
    ISSN 1806-2962
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